Francisco Curado
O tema do aparecimento da vida, da sua evolução e da sua possível distribuição no Universo tem sido um dos mais controversos quer no campo científico quer religioso.
Abrangendo áreas tão diversas como a biologia, a química, a física, a astronomia, etc., este tema deveria ser abordado por todos com a necessária dose humildade para reconhecer que nunca se pode abranger todas as áreas do conhecimento e que cada vez se torna mais difícil dominar a diversidade das matérias mesmo numa só área. Acresce que a própria ciência tem constatado ao longo dos séculos que o conhecimento não pode ser algo estabelecido e que os paradigmas de hoje poderão não servir amanhã. Sobretudo, a ciência tem demonstrado que o preconceito é o maior inimigo do conhecimento. Esta demonstração da dinâmica do conhecimento, e as suas implicações filosóficas, tem sido um dos maiores serviços que a ciência tem prestado à Humanidade. Por outro lado, a ciência é um dos pilares do espiritismo. Por estas razões, parece-nos importante começar a abordagem deste tema baseando-nos, dentro das nossas limitações, no estado actual do conhecimento nalgumas áreas da ciência, deixando para o final os comentários que o tema nos merece.
Alguns conceitos e constantes
Velocidade da luz - a velocidade da luz no vazio é de aproximadamente 300 mil km/s e é postulada pela teoria de relatividade especial (Einstein) como a velocidade máxima possível no Universo, isto é, nenhum sinal, energético ou material poderá, segundo a teoria, propagar-se no espaço a uma velocidade superior à daquela constante(2).
Distâncias - face à enormidade das distâncias com que se trabalha em astronomia e cosmologia, estas ciências adoptaram novas unidades para as medir; as mais utilizadas são: Unidade Astronómica - corresponde à distância média da Terra ao Sol e equivale a 149.600.000 km. Ano-luz - corresponde à distância percorrida durante um ano à velocidade da luz e é aproximadamente igual a 9.460.000.000.000 km.
Galáxias - as galáxias são aglomerados de estrelas e, consequentemente, de sistemas solares e seus planetas. As galáxias representam possivelmente a unidade arquitectónica básica da estrutura organizativa do Universo. As galáxias são usualmente classificadas de acordo com a sua forma em espirais (como a nossa Via Láctea), elípticas e irregulares. Estrelas e planetas - As estrelas caracterizam-se essencialmente por possuírem luz própria, enquanto os planetas não têm tal luminosidade. Para além disso, algumas características como a massa (peso) e as dimensões destes corpos são vulgarmente usadas para os distinguir. Estrelas simples/múltiplas: o nosso Sol é uma estrela simples - ela é a única a exercer influência na sua esfera de acção gravitacional, nomeadamente no nosso sistema solar. No entanto existem imensos sistemas de sóis duplos, triplos, quádruplos, em que essas estrelas se orbitam mutuamente umas às outras.
Constelações - são agrupamentos das estrelas convencionados pelos povos da Antiguidade, com base nas posições relativas dos astros visíveis a olho-nu, o que permitia a esses povos identificá-las mais facilmente no céu. Assim temos constelações com nomes de animais, de heróis e outras figuras lendárias (18) (ex.: Ursa, Escorpião, Pégaso, Virgem, etc.). O nosso lugar no Universo(3): embora seja impossível no nosso actual estado do conhecimento pensar em estabelecer a nossa posição absoluta (se é que tal existe) no Cosmos, podemos no entanto situar-nos relativamente a sistemas mais simples. Assim, a Terra é um dos planetas do nosso Sistema Solar, girando em torno de uma estrela de grandeza média denominada Sol. Por sua vez esta estrela central do nosso sistema é uma dos muitos milhões (400 mil milhões) de estrelas que povoam a galáxia a que pertencemos, designada Via Láctea.
Algumas distâncias do nosso planeta a outros objectos celestes: à estrela Sírio (no Cão Maior): 8,7 anos-luz; à estrela Polar (na Ursa Menor): 680 anos-luz; à galáxia de Andrómeda: 500 milhões de anos-luz! Universo observável: actualmente é possível observar da Terra mil milhões de galáxias.
Origem e evolução do Universo
O modelo actualmente mais aceite pela ciência (mas não o único) para a origem do Universo assenta num fenómeno designado por Big-bang (Grande Explosão). De acordo com este modelo, tudo (o nosso espaço-tempo) teria começado numa singularidade que concentraria, com uma densidade extraordinariamente elevada, toda a massa actual do Universo - ao explodir essa singularidade daria origem à matéria e energia do Universo actual, que desde então ainda não parou de se expandir. Esta teoria tem vindo a ser suportada por muitas das observações astronómicas, entre as quais se encontra a detecção da existência de uma radiação de fundo (de micro-ondas) que parece banhar todo o Universo.
À luz desta teoria tem-se tentado explicar não só a origem, mas também a estrutura actual e a evolução do Universo, tentando prever também o seu futuro, i.e., derivou-se uma cosmologia a partir do modelo do Big-bang. Uma das suas consequências é que o Universo teve um início catastrófico e provavelmente terá um fim.
Embora esta cosmologia seja a que mais adeptos tem granjeado, alguns astrofísicos adoptam posições alternativas e têm vindo a apresentar argumentos de peso em desfavor da teoria do Big-bang(6). Uma destas posições corresponde à cosmologia do Plasma, segundo a qual não há início nem fim (no tempo) para o Universo.
Recentemente, uma nova Cosmologia tem vindo a ser divulgada. Trata-se de uma tentativa de unificar a mecânica quântica (que é aplicada no estudo das partículas subatómicas) com a cosmologia baseada na relatividade geral de Einstein (que é uma teoria da gravidade). Esta nova ciência tem tido a adesão de físicos como Stephen Hawking e o prémio Nobel Murray Gall-Mann.
O mais interessante desta nova abordagem da cosmologia é que os novos modelos para a origem do Universo estabelecem que não teria surgido um Universo, mas sim um Multiverso, ou seja uma multidão de Universos (17).O nosso Universo não seria mais do que uma bolha quântica num oceano infinito de universos paralelos. Nesta visão, os big-bangs ocorrem a todo o momento, e o vácuo está constantemente a gerar novos universos. Com se isto não fosse suficientemente surpreendente, físicos como Stephen Hawking visualizam o nosso universo como estando ligado a todos os outros através de uma teia infinitamente vasta de ligações constituídas pelos túneis no espaço conhecidos por wormholes (buracos de verme).
Planetas versus estrelas
Os planetas são, no entender da maioria dos cientistas, o berço da vida. Esta consideração prende-se com as condições ambientais que os planetas podem oferecer, já que corpos como as estrelas produzem uma tal quantidade de energia que inviabiliza a formação de compostos estáveis e será impensável encontrar matéria orgânica numa estrela. Da mesma forma, corpos mais pequenos como asteróides ou cometas não disporiam das condições necessárias de estabilidade para assegurar a presença de vida. Parece-nos que mesmo de um ponto de vista científico, esta visão da vida é fortemente antropocêntrica e que a discussão do tema centrada nestas ideias deveria ter um título menos genérico. De qualquer forma alguns autores como Carl Sagan sugeriram já formas de vida alternativas muito exóticas, que poderiam habitar planetas para nós tão inóspitos como Vénus ou Júpiter.
O modelo mais aceite para a formação de planetas consiste na condensação da matéria que em forma de poeira orbita ainda a maior parte das estrelas após a sua formação. A condensação irregular desta poeira, dará origem a pequenos corpos, que por sua vez, através da atracção gravítica, irão incorporando mais matéria, até formarem corpos individualizados de grandes dimensões como os planetas. Este processo levaria cerca de 10 milhões de anos a consumar-se, esgotando a nuvem de poeira.
Calcula-se que actualmente 60 por cento das estrelas jovens apresentem discos de poeira em redor de si. Esta estimativa aponta portanto para uma probabilidade relativamente elevada de existência de sistemas planetários orbitando grande parte das estrelas. A pesquisa de planetas noutros sistemas solares é no entanto extremamente difícil, e para já não é possível de forma directa, i.e., não existem meios actualmente para observar planetas fora do nosso sistema solar; a sua detecção é feita de forma indirecta, através das perturbações que os planetas provocam nas órbitas das estrelas que circundam, bem como na luminosidade observável dessas estrelas. Muito recentemente, considerava-se que seriam necessários 20 a 30 anos de investigação para detectar um planeta com a massa de Saturno noutro sistema solar. Considerava-se também que apenas estrelas simples permitiriam a formação de discos de poeira de onde poderiam originar-se planetas. Para além disso, apenas estrelas bem comportadas (estáveis) como o nosso Sol permitiriam a coexistência de sistemas planetários. Como se estima que apenas 20 a 40 por cento das estrelas do tipo do Sol serão estrelas simples, aquele factor condicionaria muito a possibilidade de formação de planetas semelhantes ao nosso. Assumia-se também que para além de uma certa massa crítica (aproximadamente a massa do planeta Júpiter), não se poderia formar um planeta - estaríamos em presença da génese de uma estrela. No entanto, diversas descobertas recentes demonstraram a falibilidade de algumas destas considerações. Entre as novidades mais recentes conta-se a detecção de dois planetas com as dimensões da Terra orbitando uma pulsar(7) (uma estrela na fase final do seu colapso, que roda a velocidades vertiginosas, emitindo feixes de energia periódicos, como um farol no espaço), a descoberta de planetas orbitando sistemas estelares múltiplos e a descoberta de novos planetas com massas iguais e superiores à de Júpiter(19). Para além disso, a técnica de detecção de planetas tem evoluído muito rapidamente nos últimos anos, tendo-se detectado planetas bastante exóticos e em condições bastante inesperadas. Parece, pois, poder concluir-se que a probabilidade de existência de planetas em torno das estrelas será bastante superior ao que se vinha estimando.
A estrutura do Universo
Os astrónomos já há muito que concluíram que o nosso Universo não é apenas um mar de estrelas e seus planetas dispersos pelo espaço. Pelo contrário, apresenta uma estrutura bem evidente, a diversos níveis. Assim, as estrelas encontram-se agrupadas em galáxias, as galáxias constituem grupos de ordem mais elevada designados enxames (clusters), e estes por sua vez formam super-enxames, presumindo-se que estes representem a hierarquia máxima dos sistemas ligados por forças gravitacionais. O enxame ao qual pertence a nossa galáxia é denominado Grupo Local e por sua vez faz parte do super-enxame da Virgem. Num mapa do Universo recentemente elaborado por investigadores do Harvard-Smithsonian Center of Astrophysics, revela-se a estrutura dos grandes grupos, circundados por grandes espaços vazios(12). Este tipo de estrutura é um dos grandes mistérios da cosmologia actual, uma vez que, partindo de uma origem explosiva como o Big-bang, seria mais razoável esperar que a matéria estivesse uniformemente distribuída pelo Universo. Existe um princípio fundamental na Física (mais concretamente o segundo princípio da termodinâmica) que postula que num sistema deixado entregue a si próprio a entropia tende a aumentar, a desordem tende a ser máxima; isto é precisamente o contrário do que observamos no nosso Universo.
Criação-destruição contínua material
Tal como já foi atrás referido, a propósito da cosmologia quântica, aceita-se que nova matéria esteja constantemente a ser gerada do "nada".
De forma semelhante, supõe-se que determinados objectos cósmicos como os quasares e os buracos-negros sejam verdadeiros devoradores de matéria. Os quasares geram quantidades tão grandes de energia que hoje em dia a única explicação para tal é a de que aqueles objectos gigantes estejam a devorar e esmagar galáxias inteiras, emitindo a energia que está associada a tais processos.
Por seu lado, os buracos-negros serão singularidades espaciais que concentram matéria num estado de densidade tão elevado que nada, nem mesmo a luz, consegue escapar ao seu campo gravitacional, tornando-os desta forma invisíveis. Este corpos têm assim a capacidade de atrair e devorar irremediavelmente tudo (estrelas incluídas) o que possa cair na sua esfera de influencia. Supõe-se existir um desses buracos-negros no centro da nossa galáxia, para além de outros já terem sido detectados de forma indirecta.
Planetas-urbe
Desde há muito que a hipótese de existirem outros planetas habitados para além do nosso tem vindo a ser colocada, sobretudo nos meios científicos. De facto, atentando na grandeza do Universo de que temos estado a falar, deixou de fazer sentido pensar que a Terra poderia ser um caso especial como único planeta votado ao aparecimento de vida. Como veremos mais à frente, o número de corpos celestes observáveis é tão grande que o número de planetas que se calcula existirem no Universo deve ser suficiente para, com base em cálculos probabilísticos simples, podermos asseverar que deve existir vida semelhante à nossa em muitos outros sistemas planetários.
A origem da vida na Terra
A história da origem da vida na Terra tem sido apresentada nas últimas dezenas de anos com base no modelo que Urey e Miller derivaram nos anos 50 das suas experiências com alguns dos presumíveis elementos constituintes do habitat terrestre há cerca 3500 milhões de anos: a água, a amónia e o metano entre outros, e a energia associada aos raios ultravioleta e às descargas eléctricas na atmosfera (relâmpagos). Segundo este modelo, a vida teria surgido espontaneamente, com base naqueles ingredientes, na Terra primitiva. Este modelo foi de tal forma aceite pela generalidade da comunidade científica que ainda hoje é aquilo que se ensina aos jovens nas escolas, quase como uma verdade absoluta. No entanto, não só não é o único modelo existente, como nem sequer é universalmente aceite pela comunidade científica. Na realidade, a implantação deste paradigma é mais um exemplo de como, em ciência, muitas vezes se acaba por aceitar aquilo que em dado momento é útil aceitar. Robert Shapiro, um bioquímico, professor na Universidade de Nova Iorque, no seu cativante livro "Origens..." aborda o tema da origem espontânea da vida referindo os estudos que alguns teóricos efectuaram, aplicando o cálculo de probabilidades. Assim, Hoyle e Wickramasinghe, dois cientistas que inicialmente subscreveram a hipótese da geração espontânea, calcularam a probabilidade de que se formasse espontaneamente não uma bactéria, mas apenas o conjunto das enzimas que a integram: a probabilidade de isto acontecer seria 1 em 1.040.000 (1 seguido de 40 mil zeros) que os autores compararam à de que «um tornado atingisse uma lixeira e montasse um Boeing 747 a partir dos materiais aí depositados». Como se estes cálculos não bastassem, um físico da Universidade de Yale, Harold Morowitz efectuou cálculos mais rigorosos e obteve a probabilidade inimaginável de 1 em 10.100.000.000.000, um valor tão esmagadoramente baixo, que o tempo necessário para a tornar viável é infinitamente maior do que a duração previsível do nosso Universo.
Afigura-se compreensível portanto que os especialistas tentem encontrar alternativas para aquele modelo.
Entre outras hipóteses alternativas coloca-se hoje a da origem cósmica da vida na Terra. Assim, a Terra teria sido "contaminada" com matéria orgânica trazida por corpos celestes tais como meteoritos que bombardearam intensamente o nosso planeta até há cerca de 3500 milhões de anos, precisamente a idade que se estima para a vida na Terra. Esta hipótese é tanto mais verosímil quanto mais se sabe hoje que o nosso planeta continua a receber partículas de pó interplanetário que contribuem com cerca de 300 toneladas de matéria orgânica por ano. O problema com a hipótese da origem cósmica da vida na Terra é que esta não faz mais do que adiar a questão - temos sempre que colocar a pergunta: mas então como se formou a vida no local de onde proveio? A questão continua em aberto.
Revista de Espiritismo nº. 32, Julho-Agosto-Setembro 1996
texto - http://www.panoramaespirita.com.br/novo/artigos/ciência
imagem - ovnihoje.com
Um comentário:
Será que estamos numa era que vai mudar a base estrutural da teoria da relatividade onde o foton atingiu a velocidade acima da luz?
de qualquer forma, estamos vendo o aprofundar na ciência em sua totalidade, mostrando que ela vai num crescendo, mas respaldado na evolução do homem. Sem a evolução humana, a ciência não ultrapassará limites delineados pela própria lógica evolucionária.
Abraços
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