domingo, 30 de outubro de 2011

PSICOPICTOGRAFIA


Rogério Coelho

"(...) Dai gratuitamente o que gratuitamente haveis recebido".
Jesus. (Mt., 10:8.)

É absolutamente imprescindível que os Espíritas busquemos afeiçoar o movimento espírita aos seguros e coerentes parâmetros oferecidos por Jesus e ratificados por Kardec.

Segundo o ensinamento1 do Mestre Lionês, entre as criaturas que se convenceram das verdades espíritas através de um estudo direto, existem as que podemos chamar de espíritas experimentadores, isto é, os que crêem pura e simplesmente nas manifestações, sem que isso os torne criaturas melhores ou os sensibilize para a necessidade do aperfeiçoamento constante. Para esses o Espiritismo é apenas uma ciência de observação, uma série de fatos mais ou menos curiosos...

Evidentemente essas pessoas não podem ser arroladas como verdadeiros espíritas ou espíritas cristãos, conforme o entende Kardec.

A Doutrina Espírita nasceu dos fenômenos, mas já se emancipou deles. O fenômeno é apenas a "casca", e agora devemos nos ocupar _ exaustivamente _ da "polpa". Daí não se justificar o que temos observado em terras brasileiras e estrangeiras, ou seja: um exacerbamento da feição fenomênica do Espiritismo em detrimento do essencial que é o estudo doutrinário.

Nessa avassaladora onda fenomênica, a pintura mediúnica tem se destacado, para alegria e perda de tempo dos curiosos de superfície...

As conseqüências disso são danosas para o movimento espírita com suas Instituições sempre às voltas com parcos orçamentos para atender à demanda da área social e às vezes até mesmo gastos administrativos comuns, vez que o arrocho financeiro faz com que muitos se inclinem para a venda das pinturas mediúnicas para ocorrer às despesas sempre crescentes. E as noitadas de "Renoir" e outros vão acontecendo aqui e acolá...

Em matéria de mediunidade ainda está valendo a regra áurea sancionada por Jesus há dois milênios: (Mt., 10:8.)

"Dai gratuitamente o que gratuitamente haveis recebido".

Alguns Espíritas menos avisados e ingênuos, doutrinariamente inseguros, tendem a transformar suas Casas Espíritas em "atelier" de pintores famosos, no que são até mesmo aconselhados e estimulados pelos médiuns do "métier".

Alguns desses médiuns pintores têm uma superlotada agenda no Brasil e exterior, e com esse efeito multiplicador, lá vem mais loucuras para o nosso movimento espírita.

Já ouvimos de um confrade muito crédulo e místico que uma pintura mediúnica "irradia" vibrações terapêuticas no ambiente onde a dependuram, e pasmem! Não são poucas as pessoas que acreditam nisso!...

Não é sem motivo que muitas vezes Jesus dizia:

"Até quando vos suportarei?"

Perguntaram a Vianna de Carvalho como é vista no Mundo Espiritual a comercialização no terreno da arte. Eis a resposta do Mentor2:

"Desde que não se trate de uma realização eminentemente mediúnica, caracterizando-se pelo esforço pessoal daquele que produz a obra de Arte, é justo que a possa dispor conforme lhe aprouver. Face ao encontro de compradores, alguns dos quais se tornam mais investidores financeiros do que admiradores do Belo é válido que venda o seu trabalho, a fim de viver com dignidade. Entanto, todo excesso é prejudicial, e na Arte, em razão das ambições que entram em jogo comercializando-a, e impedindo que os menos aquinhoados financeiramente possam também desfrutá-la, torna-se uma conquista lamentável para aqueles que a possuem para deleite exclusivo do seu orgulho e egoísmo.

No passado, geralmente, com poucas exceções, os artistas viveram e desencarnaram faltos de recursos, especialmente quando sua expressão de Arte não correspondia aos padrões convencionais estabelecidos, inspirando-se, ainda mais no próprio sofrimento e produzindo incomparáveis obras que vêm sensibilizando a cultura da Humanidade séculos em fora".

Falando da pintura mediúnica propriamente dita, perguntaram ainda ao Nobre Mentor3:

"Pintura mediúnica é arte? Traria ela alguma importância real para o Movimento Espírita, para a Doutrina Espírita?"

Resposta: "Da mesma forma que a psicografia e a psicofonia, nas expressões da mediunidade intelectual, contribuem valiosamente para a comprovação da imortalidade, ao lado de outras manifestações positivas do fenômeno mediúnico, a psicopictografia é recurso nobre de arte para a confirmação da sobrevivência do Espírito à disjunção molecular do corpo. O estilo do pintor, suas características, sua mensagem oferecem expressivo contributo para a afirmação da Vida após o túmulo, como também pelo ensejo que oferece de trazer beleza e harmonia para encanto das criaturas humanas.

À Doutrina Espírita não oferece maior contribuição, tendo-se em vista que a Codificação encontra-se estruturada e completa, não sendo a mediunidade psicopictográfica que irá aumentar a sua excelente proposta de sabedoria.

O fenômeno necessita da Doutrina a fim de se explicar, porém a Doutrina dispensa o fenômeno, por ser ela um conjunto de lições profundas e ricas de iluminação e beleza, de que o insigne Allan Kardec se fez o incomparável intermediário.

Assim, o fenômeno confirma a Doutrina e essa elucida-o".

Faz-se mister maior vigilância a fim de que não tenha o próprio Cristo que voltar aos arraiais espiritistas para - outra vez - expulsar os vendilhões do Templo. Aliás, essa vigilância deve estar sempre ativa e redobrada porque em Doutrina Espírita os fins não justificam os meios.

Há que se ter sempre em conta que o Espiritismo não possui qualquer similar, e temos que pagar o preço pela coerência doutrinária, jamais permitindo a infiltração dos modismos e loucuras do mundo em nossas Casas Espíritas.


1 - Kardec, A. "O Livro dos Médiuns" - 1ª parte - Capítulo III, item 28, § 1º.
2 - Vianna de Carvalho/Franco, D.P. "Atualidade do Pensamento Espírita" - Questão 153 - LEAL
3 - Vianna de Carvalho/Franco, D.P. "Atualidade do Pensamento Espírita" - Questão 139 - LEAL

(Jornal Mundo Espírita de Novembro de 2000)



texto - http://www.espirito.org.br/portal/artigos/mundo-espirita

imagem - mitologiasemisterios.blogspot.com

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

DOR EVOLUÇÃO, DOR EXPIAÇÃO, DOR AUXÍLIO


Vitor Ronaldo Costa

Esquemas Impulsionadores da Evolução Anímica, Vigentes Em Planetas Provacionais. "Pois bem: que se figure a Terra como sendo um subúrbio, um hospital uma penitenciária, uma região malsã, porque ela é ao mesmo tempo tudo isso, e se compreenderá por que as aflições sobrepujam as alegrias...” (Allan kardec. "O Evangelho Seg. o Espiritismo", cap. 111, item 7).

Significativa parcela da comu­nidade planetária desconhece a verdadeira causa e o valor do processo doloroso no inter­câmbio habitual com a criatura humana. Quando avaliada "a vôo de pássaro", a dor é tida na conta de tormento inde­sejável capaz de suscitar o sofrimento, as lágrimas e o pavor das criaturas deses­peradas perante as aflições terrenas. Todos repudiam a dor, desejam afastá-la por qualquer meio, muito embora, apenas a vontade, nem sempre seja o recurso su­ficiente para impedir a visita daquela que se esconde sob o manto de duas variantes implacáveis: a dor física e a dor moral. Ao contrário do que imaginam os desa­visados, a dor não se trata de um castigo imposto por Deus ou de uma condição aleatória que nos atinge sem um motivo aparente. De acordo com os princípios que norteiam a doutrina espírita, o acaso e o determinismo absoluto inexistem, de maneira que, ninguém deveria atribuir a tais fatores a causa das desditas atrozes que, por vezes, fustigam a alma humana. Diante do fato impõe-se o conhecimento de causa, maneira correta de se nortear os passos na desafiadora caminhada ao longo da existência planetária. Ao clas­sificar o orbe terreno como morada de provações e expiações, Allan Kardec nos alerta para o atual padrão evolutivo da humanidade, na medida em que ressalta a prevalência do mal sobre o bem. Ora, isto serve como um chamamento capaz de nos predispor ao esforço da reforma íntima. Então, conscientizados de nossas atuais restrições evolutivas, não podemos falar de dor sem fazer referência à questão da responsabilidade individual posta em prática no decorrer das reen­carnações sucessivas. A tendência da maioria é culpar a má sorte, como se as aflições corriqueiras não respondessem aos mecanismos sutis da mente assolada por dívidas morais e sentimentos de culpa. Por isso, costumamos afirmar que as di­retrizes espíritas servem para aclarar a nossa percepção interior, facilitando-nos a reflexão a respeito das próprias vivências desarmônicas ensaiadas em todas as épocas. O mal que infligimos aos se­melhantes não se dilui na esteira dos tempos, assim como a fumaça se dissipa no ar atmosférico. A memória espiritual retém em seus refolhos os atentados co­metidos intencionalmente contra a har­monia cósmica. Todavia, o remorso re­sultante assemelha-se a verdadeiro corpo estranho passível de atormentar o equi­líbrio desejável do nosso campo mental. A consciência profunda, a cenoura infle­xível de nossas atitudes infelizes, em determinado instante, nos impele à drenagem saneadora daquilo que nos in­felicita. Invariavelmente tal escoamento se processa por meio das múltiplas formas de sofrimento e aflição. A dor sinalizada reflete a quantidade de desarmonia in­terna de que se é portador. Quanto maior a sua intensidade, maior a pendência a ser resolvida da melhor maneira no trans­correr do jornadear terreno. Portanto, em relação à dor, o problema é de ordem individual, pois a alma, na condição de instrumento refletivo da perfeição divina não apresenta condições de albergar em sua intimidade, por tempo dilatado, aquilo que não contribua para o engrandecimento progressivo de si própria. O livre arbítrio constrói diariamente o nosso destino, alter­nando harmonia e felicidade ou sofri­mento e tristeza, tudo na dependência do comportamento com o qual marcamos as nossas existências. O espírito André Luiz, o querido mentor residente na metrópole espiritual "Nosso Lar", nos propicia signi­ficativas informações ao discorrer sobre os três tipos de dor experimentados pelo ser encarnado. Vejamos cada um deles.

1- Dor-evolução. -
"A dor é ingre­diente dos mais importantes na economia da vida em expansão. O ferro sob o malho, a semente na cova, o animal em sacrifício, tanto quanto a criança chorando, irresponsável ou semicons­ciente, para desenvolver os próprios órgãos, sofrem a dor-evolução, que atua de fora para dentro, aprimorando o ser, sem a qual não existiria progresso"l. Ampliando ainda mais este conceito po­demos aduzir ao citado esquema, outros acontecimentos tidos na conta de desafios provacionais, comuns a quase todos nós na condição de encarnados. O que ca­racteriza a dor-evolução é o confronto com os vetores desarmonizantes que nos atingem de fora para dentro, mas que servem para estimular a paciência, a re­signação, a fé, o perdão e a capacidade de luta. Poucos amadurecem efetivamente sem que experimentem dificuldades e obstáculos de toda ordem. "A luta inten­siva, porém, dilata as aspirações íntimas. O sofrimento, quando aceito à luz da fé viva, é uma fonte criadora de asas es­pirituais"2. Os exemplos são incontáveis: é o convívio com o parente difícil; a pa­ciência a ser requisitada diante do côn­juge incompreensivo; a dificuldade em educar e encaminhar para o bem o filho rebelde; as pressões exercidas pela chefia no trabalho profissional; a ameaça de perda do emprego honesto que nos sus­tenta; a traição de alguém muito amado em quem depositávamos irrestrita confiança; a perda precoce de um ente querido vi­timado por acidente ou doença incurável e assim por diante. São problemas corri­queiros, comuns à maioria das pessoas, mas que nos atingem de inopino nos deixando marcados pela dor dilacerante e pelas lá­grimas sentidas. As provações, quando enfrentadas com a devida resignação e con­fiança no auxílio do Pai Maior, não passam de convites da própria vida ofertados em prol do nosso aprimoramento íntimo.

2- Dor-expiação.
Os erros humanos decorrentes da cólera incontrolável, do egoísmo obsessivo, das viciações incon­seqüentes, da sexualidade irresponsável, da maldade premeditada, às vezes, com requintes de sadismo, são os vetores res­ponsáveis pelos débitos morais que se acumulam nos bancos imperecíveis de nossa memória espiritual. A prática do mal desarmoniza profundamente a essência pensante, cria uma espécie de morbo energético de teor vibratório bastante densificado, que permanece aderido à malha eletromagnética sutil do campo perispiritual. Constitui-se algo incomo­dativo e desagradável, por tratar-se de verdadeira moléstia a pulsar nas entranhas multi dimensionais do ser. Tal condição anômala de natureza anímica é a respon­sável pelo desencadeamento, na criatura encarnada, de manifestações degenera­tivas do organismo físico (mal-formações congênitas, cânceres etc.) tanto quanto de perturbações mentais, ao mesclar crises de intenso remorso com depressões pro­fundas e manifestações esquizofrênicas de difícil solução. Assim, manifestam-se as chamadas doenças cármicas, expressões autênticas das expiações educativas. A dor-expiação se diferencia da condição citada no item anterior, por não decorrer dos fatores agressivos externos. Aí está a diferença. Vejamos a respeito, o pen­samento de André Luiz: "Em nosso es­tudo, porém, analisamos a dor-expia­ção que vem de dentro para fora, marcando a criatura no caminho dos séculos, detendo-a em complicados la­birintos de aflição, para regenerá-la, perante a Justiça... "3. Infelizmente a dor-expiação constitui-se contingên­cia assídua em nossa programação en­carnatória, porquanto, nos revelamos carentes de maiores aquisições evan­gélicas, exceção feita àqueles que já superaram as más tendências e se mos­tram familiarizados com as práticas da justiça, do amor e da caridade.

3- Dor-auxílio.
A reencarnação é um desafio expressivo enfrentado com certa preocupação pelos espíritos mediana­mente evoluídos. No que pese as boas intenções, às vezes, tais espíritos, quando encarnados, se deixam empolgar pelos atrativos mundanos e, invigilantemente, sofrem desvios dos planos previamente traçados no Mundo Maior, não suportando as provações retificadoras ou assumindo atitudes infelizes passíveis de precipitarem o fracasso da experiência terrena. Todavia, deixamos do outro lado da vida, aqueles espíritos bondosos que nos são caros e interessados em nossa proteção. Por isso, diante da ameaça de tropeços lamentáveis, em certas ocasiões, somos beneficiados pelo amparo de exceção, ou seja, provi­dências aparentemente drásticas, mas cabíveis nos esquemas traçados pelos benfeitores desencarnados em nosso próprio benefício. "O enfarte, a trombose, a he­miplegia, o câncer penosamente suporta do, a senilidade prematura e outras calamidades da vida orgânica constituem, por vezes, dores-auxílio, para que a alma se recupere de certos enganos em que haja incorrido na existência do corpo denso, habilitando-se através de longas reflexões e benéficas disciplinas, para o ingresso respeitável na Vida Espiritual". Em quantas ocasiões, quando compro­metidos pela enfermidade grave ou pro­longada, nos sentimos infelizes e desam­parados por Deus. Pois bem. É justamente em tais circunstâncias que devemos buscar a serenidade mental e agradecermos à Pro­vidência pela doença oportuna que nos impediu a tomada de uma atitude insana. Nada acontece sem uma razão plausível, mesmo que, em nossa miséria, não en­tendamos o significado real da ocorrência. Em verdade, nem sempre interpretamos corretamente o empenho dos bons es­píritos em nosso favor. Qualquer contingência dolorosa me­rece de nossa parte uma atenção especial. De acordo com a lei de causa e efeito sempre colhemos o fruto saudável ou não da semeadura escolhida. O sofrimento resulta do mal, assim como a felicidade, do bem praticado. Não olvidemos, en­tretanto, as várias iniciativas alicerçadas no bom senso a serem mobilizadas na vigência da dor. São resoluções passíveis de minorar as crises temporárias pelas quais transitamos. A prece habitual, o comportamento retificador, o descortino mental e o bem que se pode patrocinar ao próximo, retratam as atitudes inteligentes daqueles que almejam o bom aproveita­mento da reencarnação bendita.

Referências bibliográficas:

1- André Luiz & Fco. C. Xavier. "Ação e Reação", cap. 19, pg.261, 13edição (FEB).

2- André Luiz & Fco. C. Xavier. "Missio­nários da Luz", cap. 16, pg. 267, 9ª edição (FEB).

3- André Luiz & Fco. C. Xavier. "Ação e Reação", cap. 19, pg. 261, 13ª edição (FEB).

4- Idem, pg. 261.

Nota: o autor é Médico, escritor e expositor espírita.

Revista Internacional de Espiritismo - Junho de 2004



texto - http://www.panoramaespirita.com.br/novo/artigos
imagem - vivendoemsintonia.com

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O CÉREBRO TRINO E A NOSSA CASA MENTAL


Irvênia L. S. Prada *


Na recente publicação “Minds behind the Brain (2000), de STANLEY FINGER, encontra-se logo no Prefácio, a expressão “The Organ of Mind”, referente ao cérebro. ANDRÉ LUIZ já emitia esse mesmo conceito em “No Mundo Maior” (1947, cap. 4), ao assinalar: “O cérebro é o órgão sagrado de manifestação da mente, em trânsito da animalidade primitiva para a espiritualidade humana.”
É interessante atinarmos para a segunda parte desse enunciado de ANDRÉ LUIZ, pois também na ciência acadêmica tem-se o conceito de que o cérebro apresenta, do ponto de vista evolutivo, nas diferentes espécies (desenvolvimento filogenético), um “continuum” que se vidência pelo acréscimo de novas estruturas às que já existiam no estágio anterior, resguardadas as características de cada grupo. Portanto, o cérebro dos animais e o do ser humano são constituídos segundo um mesmo modelo.

Para ERNEST HAECKEL (naturalista alemão do séc. XIX), “a ontogênese (do grego ontos =ser) recapitula a filogênese”, pois que ao se constituir um novo ser, durante o seu processo de desenvolvimento (ontogênese), ele passa por fases que por assim dizer “recordam”, “recapitulam” estágios que caracterizam espécies mais primitivas. Assim é que, entre inúmeros exemplos, são encontrados nos embriões de mamíferos, arcos e fendas branquiais, que são estruturas próprias dos peixes. Este mesmo aspecto permeia a organização não apenas do cérebro mas, de todo o sistema nervoso (SN) do ser humano, que reflete hoje a somatória de diferentes estágios que encontramos entre os animais.

Conforme refere CARL SAGAN em seu livro “Os Dragões do Éden” (1977 - cap. III – “O Cérebro e a Carroça”), o principal expoente contemporâneo desse estudo evolutivo do SN humano é PAUL MAC LEAN que aborda em seu trabalho, diferentes espécies animais, desde lagartos até macacos, alem do homem. Este autor postula que, no SN Central humano, a medula espinal e o tronco encefálico representam partes formadas por unidades que se sucedem, enquanto o cérebro e o cerebelo tem formação concêntrica, ou seja, em camadas que se justapõem sobre um núcleo inicial. Observando a estrutura dessas diferentes partes, em diferentes grupos de animais, MAC LEAN estabeleceu o que chamou de “Lei de Maturidade e de Estabilidade Evolutiva”. Assim, considera que a medula espinal (Complexo Segmentar ou “S”) já se apresenta estabilizada desde os peixes, ou seja, peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos exibem (apesar das características próprias), o mesmo modelo básico de estruturação da medula espinal.

Quanto ao tronco encefálico (Complexo Reptiliano ou “R”), estabilizou-se apenas a partir dos répteis. Poderíamos pensar que a natureza tentou um modelo nos peixes, depois nos anfíbios mas, foi a partir dos répteis que esse modelo teve aval para continuar, como continuou, a caracterizar o tronco encefálico de aves e de mamíferos, inclusive o homem.

Por sua vez, o cérebro (Complexo de Cerebralização), representado pelos sub-estágios Opto-Estriado (ou Tálamo-Estriado), Sistema Límbico e Córtex Cerebral, encontra-se ainda instável, o que sinaliza a possibilidade de mudanças futuras.

Em “The Triune Brain in Evolution” (1968), MAC LEAN comenta que a medula espinal e o tronco encefálico representam a maior parte da maquinaria requerida para o desempenho das funções de autopreservação e de perpetuação da espécie. Muitos dos vertebrados mais desenvolvidos são providos desse “chassi neural”, guiado não apenas por um “motorista” mas, por uma combinação simultânea de três condutores, cada um deles com idade evolutiva diferente e também com características radicais próprias em estrutura orgânica, metabolismo bioquímico e organização funcional.

A partir de experiências realizadas com macacos, MAC LEAN concebeu interessante modêlo (“Cérebro Trino”) da estruturação evolutiva do cérebro humano. Diz ele: “Somos obrigados a nos olhar e a olhar o mundo através dos olhos de três mentalidades bastante diferentes, duas das quais carecem do poder da fala”. Reconhece assim, no encéfalo (melhor aqui usar-se a expressão encéfalo que cérebro, pois que a formação reptiliana envolve também porção do tronco encefálico), a existência de três formações que se dispõem concentricamente: a reptiliana, a paleomamífera e a neomamífera.

Temos muitas razões para focalizar com interesse, o estágio reptiliano de desenvolvimento do cérebro. Em “Evolução em dois Mundos” (1958), ANDRÉ LUIZ estabelece, no cap. IX (Evolução e Cérebro), que “A massa de células nervosas que precede a formação do cérebro, nos invertebrados, dá lugar à invaginação do ectoderma, nos vertebrados, constituindo-se, lentamente, a vesícula anterior ou prosencéfalo, a vesícula média ou mesencéfalo e a vesícula posterior ou rombencéfalo. Nos peixes, os hemisférios cerebrais mostram-se ainda muito reduzidos, nos anfíbios denotam desenvolvimento encorajador e nos répteis avançam em progresso mais vasto...aprimorando-se, com mais segurança, em semelhante fase, na forma espiritual, o centro coronário do psicossoma futuro, a refletir-se na glândula pineal, já razoavelmente plasmada em alguns lacertídeos (entenda-se lagartos)... é aí que a epífise começa a consolidar-se, por fulcro energético de sensações sutis para a tradução e seleção dos estados mentais diversos, nos mecanismos da reflexão e do pensamento, da meditação e do discernimento...”
Voltando ao relato de MAC LEAN, encontramos a consideração de que a Formação Reptiliana, Complexo “R” ou Cérebro Arcaico continua-se do próprio tronco encefálico (portanto, mantendo o compromisso das funções de auto-preservação e de perpetuação da espécie) e compreende também um conjunto de núcleos de substância cinzenta, localizados na profundidade dos hemisférios cerebrais em répteis, aves e mamíferos. Entende-se que esses núcleos representam o corpo estriado, sobreposto à região talâmica. O tálamo (chamado antigamente de tálamo-óptico, por acolher a inserção dos tratos ópticos) e o corpo estriado compõem conjuntamente um complexo sensitivo - motor (tálamo-estriado ou opto-estriado).

MAC LEAN ainda comenta, em “The Triune Cerebrum in Evolution” , que os resultados de experimentos neuro-comportamentais em répteis e macacos indicam que o Complexo “R” é basicamente implicado na integração dos componentes somático e autonômico envolvidos na expressão de vários comportamentos. Indicam ainda que o Complexo R encontra-se envolvido com fatores cognitivos que lideram a evocação de alguns comportamentos. MAC LEAN acrescenta que, assim sendo, pode-se dizer que o Complexo R tem uma mente própria (“has a mind of its own”).

Conforme ressalta CARL SAGAN, em “Os Dragões do Éden”(1977), o Complexo R desempenha importante papel no comportamento agressivo (pelo envolvimento do núcleo amigdalóide ou amígdala), na demarcação territorial, nas práticas ritualísticas (de acasalamento, por exemplo) e no estabelecimento da hierarquia social.

É surpreendente, continua SAGAN, quanto de nosso comportamento pode ser descrito em termos reptilianos. Falamos comumente em assassinatos a “sangue frio” e o conselho de Maquiavel em “O Príncipe” era o de “assumir a fera”. É impressionante a quantidade de mitos e de lendas, em várias culturas, sobre dragões e serpentes, enfim, sobre répteis (como a figura de São Jorge matando o dragão e a simbologia da “Tentação” de Adão e Eva pela serpente), o que talvez ressalte de maneira alegórica, a importância de atuação do complexo cerebral reptiliano, em nossas vidas.

Quanto à Formação Paleomamífera, na transição evolutiva entre répteis e mamíferos, três comportamentos básicos são desenvolvidos: 1) proteção e cuidados maternais; 2) comunicação audiovocal para manutenção do contato maternal com a prole; 3)comportamento lúdico. Em mamíferos, a origem do comportamento de proteção e cuidados materno/paternais marca o início da evolução da família e consequentes responsabilidades a ela associadas. Por sua vez, o “cuidar” de outro indivíduo, o importar-se com o outro, marca os primórdios dessa atitude de comportamento que, no ser humano chamamos de altruísmo.
São interessantes as implicações do Complexo “R” e da Formação Paleomamífera em questões epistêmicas e epistemológicas, segundo comentários do próprio MAC LEAN, entre as quais destacam-se:


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Nativismo - Em répteis e aves observados (ex.-perús), quando um dos indivíduos é afastado temporariamente do grupo, ao aproximar-se novamente é repelido, como se fosse um “estranho”. Essa talvez seja a resposta atávica, por exemplo, à queixa de muitos veteranos da Guerra do Vietnan de que, ao retornarem para casa, foram recebidos e tratados como indesejáveis estranhos;


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Intolerância a Marcas - Em um caso sugestivo, observou-se que em uma ninhada de patinhos, um deles, apos adquirir uma mancha de sangue no lado direito de sua cabeça, como resultado de algum traumatismo, passou a ser discriminado por sua mãe que persistentemente o afastava dos outros patinhos. Afastado de sua família, foi logo apanhado por um predador. Feita com tinta, marca similar em outro patinho, repetiu-se o mesmo comportamento de rejeição, o que sugere haver uma linguagem de sinais, de marcas. Sabemos que particularmente a cor vermelha, em animais de sangue vermelho, podem sinalizar para a mãe que um filhote ferido ponha em risco toda a ninhada, não apenas pelo seu enfraquecimento, que doente pode representar uma fonte de infecção para os outros, como pelo perigo de predadores, atraídos pelo característico cheiro do sangue. Talvez aí estejam as raízes comportamentais filogenéticas dos nossos preconceitos e razões de intolerância ao que interpretamos como “marcas”, como diferenças de cor, raça, formas étnicas de comportamento, religião e credos políticos. Uma inata propensão à intolerância de marcas talvez possa ajudar-nos a entender o comportamento agressivo até com derramamentos de sangue, que manifestam uns contra os outros, grupos radicais em características religiosas, raciais ou simplesmente culturais;


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Aspectos Educacionais - O grupo dos mamíferos surgiu com a característica social da proteção materna e uma considerável redução do numero de filhotes. Com o aumento do numero de alunos nas classes, resultando em confinamento social, cada criança recebe menos atenção pessoal, o que pode contribuir não apenas para um rebaixamento da qualidade de ensino como para comportamentos geradores de desordem e/ou ociosidade. No cérebro Arcaico temos o “pulso” de que precisamos chamar a atenção de alguém que nos cuide, para sobrevivermos.
A Formação Neomamífera corresponde ao Neocortex, complexo de diferentes funções que se torna progressivamente mais desenvolvido nos mamíferos mais evoluídos.

Segundo WILLIAM H. CALVIN, em “The Emergency of Intelligence” (Scientific American, october/94), o neocortex, intimamente relacionado aos processos de inteligência, apresenta extensão em área, correspondendo a quatro folhas de papel-ofício no homem, a uma dessas folhas no chimpanzé, a um envelope de carta nos pequenos macacos e a um selo de carta, nos ratos. No neocortex distinguem-se vários lobos: frontal,

É maravilhosa a associação que podemos efetuar desses conhecimentos que a Ciência nos traz com conteúdos de obras da Doutrina Espírita. É impressionante a óbvia ligação entre as informações exaradas por MAC LEAN e a estruturação de nossa Casa Mental, referida por ANDRÉ LUIZ em “No Mundo Maior” (1947, cap. 3 - A Casa Mental).

Diz ele, resumidamente: “No Sistema Nervoso, temos o cérebro inicial, repositório dos movimentos instintivos e sede das atividades subconscientes; figuramo-lo por porão da nossa individualidade, onde arquivamos os menores fatos da vida; aí moram hábito e automatismo. Na região do córtex motor, temos o cérebro desenvolvido consubstanciando as energias motoras de que se serve a nossa mente para as manifestações imprescindíveis no atual momento evolutivo do nosso modo de ser; aí localizamos o domínio das conquistas atuais, onde residem esforço e vontade. Nos planos dos lobos frontais, jazem materiais de ordem sublime que conquistaremos gradualmente, no esforço de ascensão, representando a parte mais nobre de nosso organismo divino em evolução; aí demoram o ideal e a meta superior a ser alcançada. Distribuímos, desse modo, nos três andares, o subconsciente, o consciente e o superconsciente. Como vemos, possuímos, em nós mesmos, o passado, o presente e o futuro”.
Portanto, ANDRÉ LUIZ também considera (antecipadamente a MAC LEAN) o encéfalo humano consubstanciado em três partes, cada uma delas interagindo com um dos três andares de nossa casa mental.

Particularmente, ANDRÉ LUIZ coloca em um só bloco, o complexo reptiliano e o sistema límbico (de MAC LEAN), desdobrando a atuação do neocortex em dois níveis: a região do córtex motor e a dos lobos frontais. Para o meu entendimento, a colocação de ANDRÉ LUIZ é, do ponto de vista funcional, mais adequada na interação com os três níveis considerados, para a casa mental. ANDRÉ LUIZ que me perdoe o atrevimento, mas poderíamos considerar no bloco relativo ao córtex motor, também todas as áreas sensitivas. Diríamos, então “córtex sensorio-motor”, à maneira de PIAGET. Não que se transmita a idéia de um córtex que atue simultaneamente em sensibilidade e motricidade. Quase sempre podemos separar áreas corticais sensitivas e áreas motoras. Entenda-se, portanto, que o córtex sensorio-motor compreenderia as áreas do córtex, sensíveis à recepção e processamento de estímulos (de dor, temperatura, tato, pressão, visuais, auditivos, etc.) bem como áreas motoras das quais se destaca, pela importância funcional, a chamada área motora piramidal ou voluntária, pois interage com os comandos de nossa vontade. Ao focalizar diretamente o córtex motor, ANDRÉ LUIZ foi direto ao assunto considerando, no complexo “estímulo - resposta”, o componente final, a resposta, que é efetuada, realmente, pelo córtex motor. Entretanto, como esse contendo é muito técnico, julgo que o fato de considerarmos o passo anterior do processo, isto é, a necessidade da atuação das áreas sensitivas, facilita o nosso entendimento.

Voltando à associação de complexo reptiliano e sistema límbico em um mesmo bloco, isso é coerente porque o sistema límbico vai trabalhar com a expressão de comportamentos acompanhados de emoções (primárias), e esses comportamentos são particularmente ligados a funções básicas, isto é, sexuais e reprodutivas (perpetuação da espécie) e de auto-preservação (marcação de seu território, ataque - defesa, funções alimentares, etc.).

Por sua vez, o lobo frontal, particularmente a porção mais anterior dos lobos frontais possui um neocortex de aquisição filogenética recentíssima! Representa a chamada área pré-frontal do neocortex. Ela é considerada a base funcional das chamadas funções psíquicas superiores, tais como capacidade de julgamento, crítica de situações, estratégias de comportamentos, livre - arbítrio, capacidade de aprendizado e de associação de idéias, ideação futura, planejamento, censura, etc. Enfim, as nossas mais nobres funções mentais são manifestadas fenomenicamente por intermédio da atuação das áreas pré-frontais.

Este neocortex também tem sua historia evolutiva, pois ele já se encontra relativamente desenvolvido em alguns animais, como é o caso dos chimpanzés. Aliás, em relação a isso encontramos interessante comentário de CARL SAGAN em “Os Dragões do Éden”: - “Se os chimpanzés tem consciência, se tem capacidade de abstração, não devem eles ter acesso aquilo que se convencionou chamar até agora de direitos humanos? Que inteligência terão de atingir até que seu assassínio seja considerado crime?”
Temos também no mesmo cap. 3 de “No Mundo Maior”, de ANDRÉ LUIZ:“Não somos criaturas milagrosas, destinadas ao adorno de um paraíso de papelão. Somos filhos de Deus e herdeiros dos séculos, conquistando valores, de experiência em experiência, de milênio a milênio. A crisálida de consciência, que reside no cristal a rolar na corrente do rio, aí se acha em processo liberatório; as árvores que por vezes se aprumam centenas de anos, a suportar os golpes de Inverno e acalentadas pelas carícias da Primavera, estão conquistando a memória; a fêmea do tigre lambendo os filhinhos recém-natos, aprende rudimentos do amor; o símio, guinchando, organiza as faculdades da palavra”.

Assim se estrutura a casa mental, de experiência em experiência, interagindo com a matéria e orientando a organização morfo-funcional do cérebro. Não estaria Jesus se referindo à casa mental, ao discorrer sobre a edificação de nossa casa sobre a rocha ou sobre a areia? Vamos rever a passagem? Está em MATEUS 7: 24-27 “Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as pratica, será comparado a um homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, que não caiu, porque fora edificada sobre a rocha. E todo aquele que ouve estas minhas palavras e não as pratica, será comparado a um homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia; e caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com ímpeto contra aquela casa, e ela desabou, sendo grande a sua ruína”.

A simbologia de “a casa desabar” é registrada na ocorrência dos processos obsessivos graves, principalmente na subjugação, quando a
vontade do obsidiado é dominada pelo espírito obsessor, sendo então rebaixada”. O indivíduo como que se recolhe ao seu porão. Perde a capacidade de comandar sua própria vida.
Refere ANDRÉ LUIZ em “No Mundo Maior”, cap.3 e 4, ao analisar a situação das mentes do obsessor - obsidiado, unidas no processo simbiótico do ódio e da vingança: “Espiritualmente, rolaram do terceiro andar, onde situamos as concepções superiores, e entregando-se ao relaxamento da vontade, deixaram de acolher-se no segundo andar, sede do esforço próprio, perdendo valiosa oportunidade de reerguer-se; caíram, destarte, na esfera dos impulsos instintivos, onde se arquivam todas as experiências da animalidade anterior. E completa: “Outra seria a situação de ambos se houvessem esquecido a queda, reerguendo-se pelo trabalho construtivo e pelo entendimento fraternal, no santuário do perdão legítimo”.

A figura de Nabucodonosor, rei babilônico, relatada em DN 4.30 parece expressar bem a situação do espírito que rolou as escadas de sua casa mental, retomando a vivência de seus estágios primitivos, de sua “animalidade anterior”. “Foi expulso entre os homens e passou a comer erva como os bois, o seu corpo foi molhado pelo orvalho do céu, até que lhe cresceram os cabelos como as penas da águia e as suas unhas como as das aves...” No versículo seguinte, entendemos como Nabucodonosor consegui vencer o processo obsessivo, pois aí lemos: “...levantei eu, Nabucodonosor, os meus olhos ao céu e tornou-me a vir o sentido; e eu bendisse ao Altíssimo e louvei, glorifiquei ao que vive eternamente”.
Para o confrade F.E. MINGHELLI, em “A Reencarnação - out/92 - FERGS, nos processos obsessivos que atingem funções mentais mais elevadas, há uma espécie de “desligamento” dessas atividades superiores. Quem assume o comando do corpo, então, são as áreas mais primárias e instintivas, que fazem o corpo executar automaticamente suas funções, independentemente da vontade, da razão e dos sentimentos, como nos casos de subjugação grave.

Em contra partida, a passagem de Daniel (DN.6.22), lançado à cova dos leões, é significativa: “O meu deus enviou o seu anjo e fechou a boca dos leões, para que não me fizessem dano, porque foi achada em mim inocência diante dele”.

Daniel, sempre entregue a orações, certamente vivia sintonizado no 3º andar de usa casa mental, tendo consequentemente serenado já, as suas “feras”, entenda-se, os seus impulsos instintivos, primários.

É conveniente nos lembrarmos de que expressões como “estágios animais”, “animalidade” e outras similares, em absoluto não tem o significado de maldade, violência, coisa ruim, mas sim aludem a fases primitivas, fases iniciais da evolução do ser.

Em resumo, em nossa milenar trajetória, fomos conquistando, passo a passo, os elementos estruturais que nos garantiram o cérebro que temos, “órgão” de expressão de nossa mente. Em sua profundidade, os elementos que intermediam as funções orgânicas básicas e, no córtex, particularmente o do lobo frontal, a possibilidade de transdução das chamadas funções psíquicas superiores. Detentores de livre-arbítrio, cabe-nos a opção de sintonia com ideais e nobres metas de ascensão espiritual ou, no relaxamento da vontade, com patamares primitivos de nossa casa mental.

De EMMANUEL, em “Roteiro”, temos a palavra de incentivo:

“Partindo dos elos que o prendem à estreita família do mundo,
o homem que desperta para

a grandeza da criação deambula na Terra, à maneira do viajante incompreendido e desajustado, peregrino sem pátria e sem lar, a sentir-se grão infinitesimal de poeira

nos domínios celestiais. Nesse homem, porém, alarga-se a acústica da alma e,

embora os sofrimentos que o afligem, é sobre ele que as inteligências

superiores estão edificando os fundamentos da Nova Humanidade”.

(eu grifei)

* Professora Catedrática e Médica Veterinária da Universidade de S. Paulo (USP), sendo uma autoridade mundial na comunidade científica sobre “Neuroanatomia Animal”, é também uma respeitada investigadora espírita em particular da “Interacção Cérebro-Mente” dos animais. Com vários livros e estudos científicos e espíritas publicados.

Ex-Presidente da Comissão de Ética da Faculdade de Medicina Veterinária da USP.

Ex-Presidente do Conselho Orientador da Fundação Parque Zoológico de São Paulo.



texto - http://ameporto.org/pt/artigos

imagem - jornallivre.com.br

domingo, 16 de outubro de 2011

MECANISMOS PARA A CURA ESPIRITUAL


A mediunidade de cura oferece ao médium a possibilidade de curar um ser doente, buscando fluidos em fontes energéticas da natureza. Mas será que doenças cármicas também podem ser curadas espiritualmente?

A mediunidade de cura é a capacidade possuída por certos médiuns de curarem moléstias por si mesmos, provocando reações reparadoras de tecidos e órgãos do corpo humano, inclusive as oriundas de influenciação espiritual. Assim como existem médiuns que emitem fluidos próprios para a produção de efeitos físicos concretos (ectoplasmia), temos igualmente os médiuns que emitem fluidos que operam todas as reparações acima referidas.

Na essência, o fluido é sempre o mesmo, uma substância cósmica fundamental. Mas suas propriedades e efeitos variam imensamente, conforme a natureza da fonte geradora imediata, da vibração específica e, em muitos casos (como este de cura, por exemplo), do sentimento que precedeu o ato da emissão.

A diferença entre os dois fenômenos é que no primeiro caso (ectoplasmia), o fluido é pesado, denso, próprio para elaboração de formas ou produção de efeitos objetivos por condensação, ao passo que no segundo (curas), ele é sutilizado, radiante, próprio para alterar condições vibratórias já existentes.



Médium curador

Além do magnetismo próprio, o médium curador goza da aptidão de captar esses fluidos leves e benignos nas fontes energéticas da natureza, irradiando-os em seguida sobre o doente, revigorando órgãos, normalizando funções, destruindo placas e quistos fluídicos produzidos tanto por auto-obsessão como por influenciação direta.

O médium se coloca em contato com essas fontes ao orar e se concentrar, animado pelo desejo de fazer uma caridade evangélica. Como a lei do amor é a que preside todos os atos da vida espiritual superior, ele se coloca em condições de vibrar em consonância com todas as atividades universais da criação, encadeando forças de alto poder construtivo que vertem sobre ele e se transferem ao doente. Por sua vez, este se colocou na mesma sintonia vibratória por meio da fé ou da esperança.

Os fluidos radiantes interpenetram o corpo físico, atingem o campo da vida celular, bombardeiam os átomos, elevam-lhes a vibração íntima e injetam nas células uma vitalidade mais intensa. Em consequência, acelera as trocas (assimilação, eliminação), resultando em uma alteração benéfica que repara lesões ou equilibra funções no corpo físico.

Nas operações cirúrgicas feitas diretamente no corpo físico, os espíritos operadores incorporam no próprio médium que dispõe desta faculdade. Este, como autômato, opera o paciente com os mesmos instrumentos da cirurgia terrena, porém sem anestesia e dispensando qualquer precaução de assepsia. Em certos casos, embora raros, o espírito incorporado logra o mesmo resultado cirúrgico utilizando objetos de uso doméstico (facas, tesouras, garfos ou estiletes comuns) como instrumentos operatórios, igualmente sem quaisquer cuidados anti-sépticos.

O cirurgião invisível incorporado no médium corta as carnes do paciente, extirpa excrescências mórbidas, drena tumores, desata atrofias, desimpede a circulação obstruída, reduz estenoses ou elimina órgãos irrecuperáveis. Semelhantes intervenções, além de seu absoluto êxito, são realizadas em um espaço de tempo exíguo, muito acima da capacidade do mais abalizado cirurgião do mundo físico. Em tais casos, os médicos desencarnados fazem seus diagnósticos rapidamente, com absoluta exatidão e sem necessidade de chapas radiográficas, eletrocardiogramas, hemogramas, encefalogramas ou quaisquer outras pesquisas de laboratório.

Nessas operações mediúnicas processadas diretamente na carne, os pacientes operados tanto podem apresentar cicatrizes ou estigmas operatórios como ficarem livres de quaisquer sinais cirúrgicos. Em seguida à operação, eles se erguem lépidos e sem qualquer embaraço ou dor, manifestando-se surpreendidos por seu alívio inesperado e a eliminação súbita de seus males.

Quando opera incorporado no médium, o espírito sempre é auxiliado por companheiros experimentados na mesma tarefa, que cooperam e ajudam no controle da intervenção cirúrgica, no diagnóstico seguro e rápido e no exame antecipado das anomalias dos enfermos a serem operados. Entidades experimentadas na ciência química transcendental preparam os fluidos anestesiantes e cicatrizantes, transferindo-os depois do mundo oculto para o cenário físico através da materialização na forma líquida ou gasosa, conforme seja necessário.



Cirurgias à distância

Embora o êxito das operações mediúnicas dependa especialmente do ectoplasma a ser fornecido por um médium de efeitos físicos e controlado pelos espíritos de médicos desencarnados, há circunstâncias em que, devido ao teor sadio dos próprios fluidos do enfermo, as operações produzem resultados miraculosos no corpo físico, apesar de processadas somente no perispírito.

O processo de "refluidificação", com o aproveitamento dos fluidos do próprio doente, lembra algo do recurso de cura adotado na hemoterapia praticada pela medicina terrena, na qual o médico incentiva o energismo da pessoa debilitada extraindo-lhe algum sangue e, em seguida, injetando-o novamente nela, em um processo que acelera a dinâmica do sistema circulatório.

No entanto, mesmo que se tratem de operações mediúnicas feitas diretamente na carne do paciente ou mediante fluidos irradiados à distância pelas pessoas de magnetismo terapêutico, o sucesso operatório exige sempre a interferência de espíritos desencarnados, técnicos e operadores, que submetem os fluidos irradiados pelos "vivos" a um avançado processo de química transcendental nos laboratórios do lado espiritual.

E quais são as diferenças entre as cirurgias realizadas com a presença do paciente e as realizadas à distância? No primeiro caso, os técnicos desencarnados utilizam o ectoplasma do médium de efeitos físicos e também os fluidos nervosos emitidos pelas pessoas presentes. Esta aglutinação polarizada sobre o enfermo presente possibilita resultados mais eficientes e imediatos. No segundo caso, os espíritos operadores procuram reunir e projetar sobre o doente os fluidos magnéticos obtidos pelas pessoas que se encontram reunidas à distância, no centro espírita. Porém, como se tratam de fluidos bem mais fracos do que os fornecidos pelo médium de fenômenos físicos, eles são submetidos a um tratamento químico especial pelos operadores invisíveis, a fim de se obterem resultados positivos. Mesmo assim, os fluidos transmitidos à distância servem apenas para as intervenções de pouco vulto, pois, sendo fluidos heterogêneos, exigem a "purificação" à qual nos referimos.

Existem alguns fatores que impedem as cirurgias à distância de serem tão eficazes e seguras como as intervenções diretas. Para muitos desses voluntários doadores de fluidos, faltam a vontade disciplinada e a vibração emotiva fervorosa, que potencializam as energias espirituais. Além disso, alguns deles não gozam de boa saúde, fumam em demasia, ingerem bebidas alcoólicas em excesso ou abusam de alimentação carnívora. Aliás, nos dias destinados a esses trabalhos espirituais, os médiuns deveriam se submeter a uma alimentação sóbria, já que, depois de uma refeição por vezes indigesta, o indivíduo não tem disposição para tomar parte em uma tarefa que exige concentração mental segura.



Dificuldades para os espíritos curadores

Durante o tratamento fluídico operado à distância, a cura depende muito das condições psíquicas em que os doentes forem encontrados durante a recepção dos fluidos. Os espíritos terapeutas enfrentam sérias dificuldades no serviço de socorro aos pacientes cujos nomes estão inscritos nas listas dos centros espíritas, pois além das dificuldades técnicas resultantes de certo desequilíbrio mental do ambiente onde eles atuam, outros empecilhos os aguardam, em virtude do estado psíquico dos próprios doentes.

Às vezes, o enfermo tem a mente saturada de fluidos sombrios, em face de conversas maledicentes, intrigas, calúnias e fofocas. Em outros casos, lá está ele em excitação nervosa por causa de alguma violenta discussão política ou desportiva, bem como é encontrado envolto na fumarada intoxicante do cigarro ou na bebericagem de um alcoólatra. Outras vezes, os fluidos irradiados das sessões espíritas penetram nos lares enfermos, mas encontram o ambiente carregado de fluidos agressivos, provenientes de discussões ocorridas entre seus familiares. É evidente que os desencarnados têm pouco êxito em sua tarefa abnegada de socorrerem os enfermos quando estes vibram recalques de ódio, vingança, luxúria, cobiça ou quaisquer outros sentimentos negativos.



Cirurgias durante o sono

As operações cirúrgicas realizadas no perispírito durante o sono só atingem a causa mórbida no tecido etérico deste, porém, depois de algum tempo, começam a desaparecer seus efeitos mórbidos na carne, pelo mesmo fenômeno de repercussão vibratória. Neste caso, como os enfermos operados ignoram o que lhes aconteceu durante o sono ou mesmo em momento de vigília e repouso, opõem dúvidas quanto a essa possibilidade.

Uma vez que esses doentes, tendo sido operados no perispírito, não comprovam de imediato qualquer alteração benéfica em seu corpo físico, geralmente supõem terem sido vítimas de uma fraude ou um completo fracasso quanto à intervenção feita. Acontece que a transferência reflexa das reações produzidas por essas operações se processa muito lentamente, levando semanas ou até meses para manifestarem seus efeitos benéficos no organismo. Além disso, há casos em que o enfermo recebe assistência de seus guias espirituais devido à circunstância de emergência, que não altera o determinismo de seu resgate cármico.

Toda cura se dá pela ação fluídica, já que o espírito age através dos fluidos. Tanto o perispírito como o corpo físico são de natureza fluídica, embora em diferentes estados, havendo relação entre eles. O agente da cura pode ser encarnado ou desencarnado e nela podem ser utilizados ou não processos como passes, água fluidificada e outros, além da intervenção no perispírito ou no corpo. Na cura por efeitos físicos, a alteração orgânica no corpo físico é imediatamente visível ou passível de constatação pelos sentidos ou aparelhamentos materiais.

Na ação fluídica sobre o perispírito, a cura será avaliada depois, pelos efeitos posteriores no corpo físico. Agindo através dos centros anímicos, órgãos de ligação com o perispírito, atinge-se este, que também se beneficia ao se purificar pela aceleração vibratória, tornando-se, assim, incompatível com as de mais baixo padrão.

É desta forma que se operam as curas de perturbações espirituais, na parte que se refere ao perturbado propriamente dito. Sabemos que a maior parte das moléstias de fundo grave e permanente não podem ser curadas porque representam resgates cármicos em desenvolvimento, salvo quando há permissão do Alto para curá-las. Entretanto, há benefícios para o doente em todos os casos, porque se conseguirá, no mínimo, uma atenuação do sofrimento.



A cura na mão de todos

A faculdade de curar pela influência fluídica é muito comum e pode se desenvolver por exercício. Todos nós, estando saudáveis e equilibrados, podemos beneficiar os doentes com passes, irradiações, água fluidificada etc. Aprendendo e exercitando, desenvolvemos nosso potencial de ação sobre os fluidos.

O poder curativo está na razão direta da pureza dos fluidos produzidos, como qualidades morais ou pureza de intenções, da energia da vontade, quando o desejo ardente de ajudar provoca maior força de penetração, e da ação do pensamento, dirigindo os fluidos em sua aplicação.

A mediunidade de cura, porém, é bem mais rara, espontânea e se caracteriza pela energia e instantaneidade da ação. O médium de cura age pelo simples contato, pela imposição das mãos, pelo olhar, por um gesto, mesmo sem o uso de qualquer medicamento. No evangelho, existem numerosos relatos onde Jesus ou seus seguidores curam por ação fluídica, alguns deles examinados por Allan Kardec no livro A Gênese, capítulo XV.



Condições fundamentais para a cura

É lícito buscar a cura, mas não se pode exigi-la, pois ela dependerá da atração e fixação dos fluidos curadores por parte daqueles que devem recebê-los. A cura se processa conforme nossa fé, merecimento ou necessidade. Quando uma pessoa tem merecimento, sua existência precisa continuar ou as tarefas a seu cargo exigem boa saúde, a cura poderá ocorrer em qualquer tempo e lugar, até mesmo sem intermediários (aparentemente, porque ajuda espiritual sempre haverá). No entanto, às vezes, o bem do doente está em continuar sofrendo aquela dor ou limitação, que o reajusta e equilibra espiritualmente, o que nos faz pensar que nossa prece não foi ouvida.

Para tanto, vejamos o que diz Emmanuel no livro Seara dos Médiuns, no capítulo "Oração e Cura": "Lembremo-nos de que lesões e chagas, frustrações e defeitos em nossa forma externa são remédios da alma que nós mesmos pedimos à farmácia de Deus. A cura só se dará em caráter duradouro se corrigirmos nossas atuais condições materiais e espirituais. A verdadeira saúde e equilíbrio vêm da paz que em espírito soubermos manter onde, quando, como e com quem estivermos. Empenhemo-nos em curar males físicos, se possível, mas lembremos que o Espiritismo cura sobretudo as moléstias morais".

De uma maneira primorosa, Allan Kardec nos situa sobre o assunto: "A cura se opera mediante a substituição de uma molécula malsã por uma molécula sã. O poder curativo está, pois, na razão direta da pureza da substância inoculada, mas depende também da energia da vontade, que, quanto maior for, mais abundante emissão fluídica provocará e tanto maior força de penetração dará ao fluido. Depende ainda das intenções daquele que deseje realizar a cura, seja homem ou espírito".

Daí então se depreende que são quatro as condições fundamentais das quais depende o êxito da cura: o poder curativo do fluido magnético animalizado do próprio médium, a vontade do médium na doação de sua força, a influenciação dos espíritos para dirigir e aumentar a força do homem e as intenções, méritos e fé daquele que deseja se curar.



Edvaldo Kulcheski



Revista Cristã de Espiritismo, edição especial 02.



texto - http://www.panoramaespirita.com.br/novo/artigod/56-curas
imagem - sejavocealuz.blogspot.com

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

RELIGIÃO EM ESPÍRITO E VERDADE


Com permissão do dalailam



1. O ESPIRITISMO E AS RELIGIÕES - A posição do Espiritismo, em face das religiões, foi definida desde o princípio, ou seja, desde a publicação de O Livro dos Espíritos. A terceira parte do livro tem o título de "Leis Morais", e começa pela afirmação: "A lei natural é a lei de Deus", que eqüivale ao reconhecimento da unidade divina de todas as leis que regem o universo. Note-se que Kardec e os Espíritos referem-se à lei de Deus no singular, como lei única, e nela incluem as leis morais, no plural. Assim, as leis morais são espécies de um gênero, que é a lei natural. Mas como esta não é a lei da Natureza, e sim a lei de Deus, não estamos diante de uma concepção monista natural mas de uma concepção monista de ordem ética. As religiões como fenômenos éticos, formas de educação moral das coletividades humanas, nada mais são do que processos diferenciados, segundo as necessidades circunstanciais e temporais da evolução, pelos quais as leis morais se manifestam no plano social.
Vejamos a explicação de Kardec, no comentário que fez ao item 617 de O Livro dos Espíritos: "entre as leis divinas, umas regulam o movimento e as relações da matéria bruta: essas são as leis físicas; seu estudo pertence ao domínio da ciência. As outras concernem especialmente ao homem em si mesmo, e às suas relações com Deus e com seus semelhantes. Compreendem as regras da vida do corpo, tanto quanto as da vida da alma: essas são as leis morais". Dessa maneira, o Espiritismo nos oferece a visão global do Universo, num vasto sistema de relações, que unem todas as coisas, desde a matéria bruta até a divindade, ou seja, desde o plano material até o espiritual. As religiões, nesse amplo contexto, são como fragmentações temporárias do processo único da evolução humana.
Essa compreensão histórica permite ao Espiritismo encarar as religiões, não como adversárias, mas como formas progressivas do esclarecimento espiritual do homem, que atinge na atualidade um momento crítico, de passagem para um plano superior. Daí a afirmação de Kardec, feita em O Livro dos Espiritos e repetida em outras obras, particularmente em O que é o Espiritismo, de que este, na verdade, é o maior auxiliar das religiões. Auxiliar em que sentido? Primeiro, no sentido de fornecer às religiões, entrincheiradas em seus dogmas de fé, as armas racionais de que necessitam, para enfrentar o racionalismo materialista, e especialmente as armas experimentais, com que sustentar os seus princípios espirituais diante da ciências. Depois, no sentido de que o Espiritismo não é nem pretende ser uma religião social, pelo que não disputa um lugar entre as igrejas e as seitas, mas quer apenas ajudar as religiões a completarem a sua obra de espiritualização do mundo. A finalidade das religiões é arrancar o homem da animalidade e levá-lo a moralidade. O Espiritismo vem contribuir para que essa finalidade seja atingida.
Nisto se repete e se confirma o que o Cristo declarou, a propósito de sua própria missão, ao dizer que não vinha revogar a lei e os profetas, mas dar-lhes cumprimento. Como desenvolvimento natural do Cristianismo, o Espiritismo prossegue nesse mesmo rumo. Sua finalidade não é combater, contrariar, negar ou destruir as religiões, mas auxiliá-las. Para auxiliá-las, porém, não pode o Espiritismo endossar os seus erros, o seu apego aos formalismos religiosos, a sua aderência às circunstâncias. Por que tudo isso diminui e enfraquece as religiões, expondo-as ao perigo do fracasso, diante das próprias leis evolutivas, que impulsionam o homem para além das suas convenções circunstanciais. O Espiritismo, assim, não condena as religiões. Considera que todas elas são boas - o que é sempre contestado com violência pelo espírito de sectarismo - mas pretende que, para continuarem boas, não estacionem nos estágios inferiores, já superados pela evolução humana.
Justamente por isso, o Espiritismo se apresenta, aos espíritos formalistas e sectários, como um adversário perigoso, que parece querer infiltrar-se nas estruturas religiosas e miná-las para destruí-las. Era o que parecia o Cristianismo primitivo, para os judeus, gregos e romanos. Não obstante, os ensinos de Jesus não visavam à destruição, mas ao esclarecimento e à libertação do pensamento religioso da época. Podem alegar os religiosos atuais que os espíritas os combatem, às vezes com violência. O mesmo faziam os cristãos primitivos, em relação às religiões antigas. Mas essa atitude agressiva não decorre dos princípios doutrinários, e sim das circunstâncias sociais em que se encontram os inovadores, diante da tradição. Por outro lado, é preciso considerar que a agressividade das religiões para com o Espiritismo é uma constante histórica, determinada pela própria natureza social das religiões organizadas ou positivas. Nada mais compreensível que o revide dos espíritas, quando ainda não suficientemente integrados nos seus próprios princípios.
No capítulo segundo da terceira parte de O Livro dos Espíritos, item 653, temos a explicação e a justificação da existência das religiões formalistas. Kardec estuda, através de perguntas aos Espíritos, a lei da adoração, que é o fundamento e a razão de ser de todo o processo religioso. Desse diálogo resulta a posição espírita bem definida: "A verdadeira adoração é a do coração." Não obstante, a adoração exterior, através do culto religioso, por mais complicado e material que este se apresente, desde que praticada com sinceridade, corresponde a uma necessidade evolutiva dos espíritos a ela afeiçoados. Negar a esses espíritos a possibilidade de praticarem a adoração exterior, seria tão prejudicial, quanto admitir que os espíritos que já superaram essa fase continuassem apegados a cultos materiais. A cada qual, segundo as suas condições evolutivas.
O princípio da tolerância substitui, portanto, no Espiritismo, o sistema de intolerância que marca estranhamente a tradição religiosa. As religiões, pregando o amor, promoveram a discórdia. Ainda hoje podemos sentir a agressividade do chamado espírito-religioso, na intolerância fanática das condenações religiosas. Por isso, Kardec, esclareceu em O Evangelho Segundo o Espiritismo, que o princípio religioso da doutrina não era o de salvação pela fé, e nem mesmo pela verdade, mas pela caridade. A fé é sempre interpretada de maneira particular, como a dogmática de determinada igreja a apresenta. A verdade é sempre condicionada às interpretações sectárias. Mas a caridade, no seu mais amplo sentido, como a fórmula do amor ao próximo ensinada pelo Cristo, supera todas as limitações formais. A salvação espírita não está na adesão a princípios e sistemas, mas na prática do amor.

J. Herculano Pires


texto - http://tamoporai.blogspot.com/

imagem - autoresespiritasclassicos.com

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