quinta-feira, 29 de julho de 2010

AS TEORIAS SOBRE A ORIGEM DA VIDA E A VISÃO ESPÍRITA


Roberto Lúcio Vieira de Souza



“No princípio, criou Deus os céus e a terra. A terra, porém, estava sem forma e vazia; havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava sobre as águas. Disse Deus: Haja luz; e houve luz.”

Gênesis, 1:1-3.


Estes belos ensinamentos, contidos no primeiro livro do pentateuco judaico, acrescidos de toda a descrição da criação do mundo, segundo o autor, vem sendo constantemente ponto de discussão acirrada, onde criacionistas e evolucionistas tentam provar qual das teorias estaria verdadeiramente certa.

A busca da compreensão da origem do Universo e, conseqüentemente, da origem da Vida, tem sido uma constante para a Humanidade que, no entanto, se esquece, na sua presunção, de que tal procura se confunde com a própria essência do Criador e que para tal nos falta “o sentido”, como nos afirmam os Espíritos da Codificação sobre as possibilidades do homem de compreender a Deus.

Apesar das limitações humanas, é dever da Ciência encontrar respostas para os anseios de todos, tentando explicar-nos as causas, das quais resultou o maravilhoso espetáculo da vida. Sendo assim, ainda ficam para a maioria as perguntas: A vida surgiu por acaso ou a partir de uma vontade superior? Os seres vivos sempre tiveram a aparência atual ou sofreram transformações ao longo do tempo? Os animais de diferentes espécies apresentam algum grau de parentesco? Temos um ancestral comum?

Os conflitos fizeram-se mais intensos no século dezoito, quando surgiram novas teorias que contradiziam as idéias criacionistas, que preponderavam até então.

O marco maior desses conflitos ocorreu em 1859, com a publicação do livro A Origem das Espécies por Meio da Seleção Natural, de Charles Darwin. Para Darwin, a vida resultou de mutações aleatórias da matéria a partir de modelos extremamente simples. E foi evoluindo por meio de uma seleção adaptativa dessas mutações, atendendo à necessidade de sobrevivência. Dentro de sua teoria, a vida teria começado espontaneamente no momento em que uma sopa primordial de elementos químicos básicos, submetida às condições da Terra primitiva, produziu pela primeira e única vez uma molécula replicante. A partir daí, mudanças graduais, ao acaso, permitiram o surgimento de seres cada vez mais complexos.

Dessa maneira, a evolução seria uma repetição incessante da reprodução, onde a geração anterior passaria para a próxima os genes herdados de seus antepassados, quando poderiam ocorrer pequenos erros, chamados de mutações, as quais, de forma aleatória, provocariam as mudanças progressivas nas espécies; e, no decorrer das gerações, essas mutações seriam selecionadas, atendendo à necessidade de sobrevivência daqueles grupos.

Essas colocações escandalizaram à Igreja e aos seguidores da Teoria Criacionista. É importante, porém, lembrarmos que elas não foram as primeiras idéias evolucionistas, que Lamarck já havia trazido uma abordagem neste sentido e que, num período anterior e muito próximo, Kardec já trazia ao mundo uma idéia nova, oriunda dos ensinamentos dos Espíritos, os quais reuniam posturas criacionistas e evolucionistas em uma só teoria.

Com o surgimento das idéias darwinistas e a comprovação de muitos de seus postulados, a Ciência, quase como um todo, foi assumindo a conceituação evolucionista, de tal forma que, na maioria dos países, inclusive no Brasil, ela é a única teoria sobre a origem da vida estudada nas escolas.

No entanto, é importante ressaltar que o darwinismo não é uma teoria acabada e comprovada, existindo, hoje, várias abordagens que a reforçam ou retratam-na, buscando dar explicações mais consistentes, de acordo com a evolução dos conhecimentos científicos. No início do século vinte, os cientistas Wilhelm Johannsen (inventor do termo “gene”), e Thomas Morgan (pai da teoria cromossômica da hereditariedade) deduziram que novas espécies surgiam de uma única grande mutação e não da seleção natural.

Mooto Kimura, outro geneticista, retomou a teoria neutralista, afirmando que a maioria das mudanças evolutivas, no âmbito da genética molecular, seriam neutras, ou seja, não dependentes da seleção natural.

Em 1972, os paleontólogos Stephen Jay Gould (Harvard) e Niles Eldredge (Museu de História Natural de Nova York) trouxeram uma nova abordagem, vista por muitos como complementar ao darwinismo, que afirma que a evolução acontece em saltos rápidos, quando populações pequenas desenvolvem, em períodos de não mais que 10.000 anos, novas características para se adaptar a um certo ambiente. Depois, essas espécies tendem a manter-se constantes por milhões de anos. Esse modelo explicaria a ausência de fósseis que mostrem claramente a mutação das espécies ao longo de bilhões de anos. Todo o desenvolvimento dessas idéias não foi o suficiente para sepultar a visão criacionista, que, no momento atual, se utiliza da própria biologia, da bioquímica e da matemática para sofisticar os argumentos a favor dessa última abordagem.

No entanto, é preciso lembrar que a teoria criacionista defendida pelos fundamentalistas religiosos é diferente daquela apresentada por este grupo de estudiosos. Para aqueles, que se fazem radicais em sua abordagem, a teoria da origem da vida resume-se nas seguintes premissas:

– O Universo, a energia e a vida foram criados do nada por Deus;

– Os organismos complexos não surgiram de formas mais simples da vida, através de mutações aleatórias;

– As variações entre os seres vivos limitam-se dentro de cada espécie;

– Os homens e macacos têm ancestrais distintos;

– A geologia terrestre é explicada pelo catastrofismo, a começar pelo dilúvio registrado na Bíblia;

– E a Terra é jovem, tendo menos de 10.000 anos.

Os estudiosos modernos vinculados à teoria do criacionismo afirmam terem razões não religiosas para acreditarem em suas abordagens. Para eles, a complexidade da vida requer a existência de um “planejamento inteligente”. Esta teoria já estava presente no século treze, quando Tomás de Aquino, um dos príncipes da Igreja Católica, usou o argumento da complexidade da vida como uma das provas da existência de Deus. Entretanto, o neocriacionismo, como é agora conhecido, embora defenda o “planejamento inteligente”, foge dos raciocínios metafísicos e esotéricos do passado, buscando na bioquímica suas maiores bases. Um dos principais defensores dessas idéias é o bioquímico Michael Behe, professor da Universidade Lehigh, na Pensilvânia (EUA), autor do livro A Caixa Preta de Darwin. Para ele, “a teoria de Darwin pode explicar cascos de cavalos, mas não os alicerces da vida”.

Os neocriacionistas defendem que a vida não tem nada de aleatório, seguindo a este chamado “planejamento inteligente”. A maior prova disto estaria na complexidade dos sistemas celular e molecular, os quais seriam verdadeiras máquinas cujas partes, embora independentes, estariam interligadas estreitamente e a ausência de um único componente do sistema seria o suficiente para impedir o seu funcionamento.

Exemplos dessa situação encontraríamos em estruturas como o olho humano e o sistema de coagulação sangüínea; eles só são capazes de funcionar quando todos os elementos estão presentes e em perfeitas conexões. Para eles, essa engenharia complexa não poderia ser fruto de mudanças aleatórias.

O físico Grichka Bogdanov, em seu livro Deus e a Ciência, explicando o surgimento das moléculas de nucleoproteínas, afirma: “Para que a agregação dos nucleotídeos conduzisse ‘por acaso’ à elaboração de uma molécula de ARN utilizável, teria sido preciso que a natureza multiplicasse, às apalpadelas, as tentativas, durante pelo menos 10 a(potência) 15 anos, ou seja, durante cem mil vezes mais tempo que a idade do nosso Universo” (p. 52).

Outro elemento usado para confirmar esse posicionamento encontra-se no fato de até hoje não termos registros de animais transicionais (um fóssil que fosse exatamente uma transição de uma espécie para a outra).

Michael Behe afirma em seu citado livro: “Dizer que a evolução darwiana não pode explicar tudo na natureza não equivale a dizer que a evolução, a mutação aleatória e a seleção natural não ocorram. Elas foram observadas (pelo menos nos casos de microevolução) em muitas ocasiões diferentes. Tal como os analistas de seqüência, acredito que a prova confirma convincentemente a ascendência comum.” E continua, posteriormente: “Ninguém jamais explicou de forma detalhada, científica, como a mutação e a seleção natural poderiam construir as estruturas complexas, intricadas, discutidas neste livro.” (Cap. 8, p. 179.)

Para esse grupo de estudiosos, o mundo da bioquímica está repleto de sistemas irredutivelmente complexos, verdadeiras máquinas químicas, precisas e interdependentes, que exigem uma amarração que está muito além da coincidência. Tal abordagem não é, entretanto, uma defesa direta da existência de Deus, como defendida pela maioria das religiões, mas sim de um “plano inteligente”, que necessita ainda de pesquisa para sua melhor compreensão, mas sem o qual ficam incompreensíveis muitas das situações presentes no processo evolutivo.

Chega para nós, com uma alegria e satisfação, a teoria espírita do surgimento da vida, a partir de um Criador, que é “Inteligência Suprema, Causa Primária de todas as cousas”, mas que segue suas próprias leis, que são as da Natureza em si, para realizar todo o processo evolutivo. Reúnem os Espíritos as duas teorias, retirando delas toda a postura radical, buscando desenvolver o conhecimento de forma racional e crítica.

O Espiritismo entende, como nos ensina Kardec, no seu livro A Gênese, que o texto retratado no início deste artigo, como tantas outras formas mitológicas e místicas de narração da criação do mundo, seria aquele de possível compreensão para aquele povo, em determinado momento da História, e não uma visão acabada do fato; não passaria de forma alegórica, para as mentes ainda infantis, no campo do conhecimento científico.

Sobre a criação dos mundos e do surgimento dos seres vivos, recolhemos alguns ensinamentos contidos em O Livro dos Espíritos, no capítulo III, da sua primeira parte (Ed. FEB):

– “É fora de dúvida que ele [o Universo] não pode ter-se feito a si mesmo. Se existisse, como Deus, de toda a eternidade, não seria obra de Deus.”

– “Tudo o que a esse respeito se pode dizer e podeis compreender é que os mundos se formam pela condensação da matéria disseminada no Espaço.”

– “No começo tudo era caos; os elementos estavam em confusão. Pouco a pouco cada coisa tomou o seu lugar. Apareceram então os seres vivos apropriados ao estado do globo.”

Sobre a questão da evolução dos seres a partir de um elemento comum e das suas características individuais, assim se expressam os mesmos Espíritos, na pergunta 611, do citado livro:

– “Duas coisas podem ter a mesma origem e absolutamente não se assemelharem mais tarde. Quem reconheceria a árvore, com suas folhas, flores e frutos, no gérmen informe que se contém na semente donde ela surge? Desde que o princípio inteligente atinge o grau necessário para ser Espírito e entrar no período da humanização, já não guarda relação com o seu estado primitivo e já não é a alma dos animais, como a árvore já não é a semente. De animal só há no homem o corpo e as paixões que nascem da influência do corpo e do instinto de conservação inerente à matéria.”

Ainda sobre o surgimento da Terra e a criação da vida e o seu processo evolutivo, recolhemos fragmentos do capítulo III, da primeira parte do livro Evolução em Dois Mundos, autoria espiritual de André Luiz, psicografado pelos médiuns Francisco C. Xavier e Waldo Vieira (Ed. FEB), que se ajustam aos postulados neocriacionistas, explicando-os com clareza:

“A matéria elementar, de que o eletrão é um dos corpúsculos-base (...) acumulada sobre si mesma, ao sopro criador da Eterna Inteligência, dera nascimento à província terrestre (...).”

“A imensa fornalha atômica estava habilitada a receber as sementes da vida (...).”

“Dessa geléia cósmica, verte o princípio inteligente, em suas primeiras manifestações...”

“Aparecem os vírus e, com eles, surge o campo primacial da existência, formado por nucleoproteínas e globulinas, oferecendo clima adequado aos princípios inteligentes ou mônadas fundamentais, que se destacam da substância viva, por centros microscópicos de força positiva, estimulando a divisão cariocinética.”

“Evidenciam-se, desde então, as bactérias rudimentares, cujas espécies se perderam nos alicerces profundos da evolução (...).”

“O tempo age sem pressa, em vagarosa movimentação no berço da Humanidade, e aparecem as algas nadadoras (...).”

“Mais tarde, assinalamos o ingresso da mônada, a que nos referimos, nos domínios dos artrópodos (...).”

“Avançando pelos equinodermos e crustáceos, entre os quais ensaiou, durante milênios, o sistema vascular e o sistema nervoso, caminhou na direção dos ganóides e teleósteos, arquegossauros e labirintodontes para culminar nos grandes lacertinos e nas aves estranhas, descendentes dos pterossáurios, no jurássico superior, chegando à época supracretácea para entrar na classe dos primeiros mamíferos, procedentes dos répteis teromorfos (...).”

“Contudo, para alcançar a idade da razão, com o título de homem, dotado de raciocínio e discernimento, o ser, automatizado em seus impulsos, na romagem para o reino angélico, despendeu para chegar aos primórdios da época quaternária, em que a civilização elementar do sílex denuncia algum primor de técnica, nada menos de um bilhão e meio de anos (...).”

Vemos, então, a Doutrina Espírita permanecendo com os seus ensinamentos, nestes quase cento e cinqüenta anos de existência, como recurso para o aprendizado da Humanidade, não fugindo aos estudos e pesquisas que vêm sendo desenvolvidos, demonstrando com clareza a grandiosidade do Criador, não por uma postura mágica ou miraculosa, mas pelas suas leis que se fazem presentes em todo o Universo, construindo uma história da Criação condizente com a sua Justiça, a sua Verdade, mas, acima de tudo, com o seu Amor.

Em sua lógica, quebra as fantasias dos mitos existentes em todos os povos sobre a criação do Universo, entendendo e respeitando esses relatos como formas adequadas a cada tempo para a compreensão dos fatos, sustenta idéias que vêm sendo progressivamente revistas e serão comprovadas em tempo hábil, provando a existência de Deus, a supremacia de suas Leis e a teoria da evolução direcionada por um “planejamento inteligente”; determina, porém, os limites do conhecimento humano, pelas suas condições evolutivas, quando Kardec, em O Livro dos Espíritos, na pergunta 613, comenta:

“O ponto inicial do Espírito é uma dessas questões que se prendem à origem das coisas e de que Deus guarda o segredo. Dado não é ao homem conhecê-las de modo absoluto, nada mais lhe sendo possível a tal respeito do que fazer suposições, criar sistemas mais ou menos prováveis. Os próprios Espíritos longe estão de tudo saberem e, acerca do que não sabem, também podem ter opiniões pessoais mais ou menos sensatas.”


Fonte: Revista Reformador agosto/2003

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segunda-feira, 26 de julho de 2010

FLUXO DO PENSAMENTO - LEIS DO CAMPO MENTAL


O pensamento tem início de forma embrionária em seres vivos que foram aprendendo a se concentrar com determinado teor de persistência rumo a um certo objetivo, como o de se apropriarem de um alimento. Nessa longa caminhada, o pensamento passou a ser o instrumento sutil da vontade do Espírito, que exterioriza a matéria mental para atuar nas formações da matéria física, obtendo por esse caminho as satisfações que deseja.

A matéria mental é criação da energia que se exterioriza do Espírito e se difunde por um fluxo de partículas e ondas, como qualquer outra forma de propagação de energia do Universo.

Elaborando pensamentos, cada um de nós cria em torno de si um campo de vibrações impulsionado pela vontade, que estabelece uma onda mental própria, capaz de nos caracterizar individualmente.

Obedecendo às mesmas leis da energia e partículas do mundo físico, as ondas e partículas da matéria mental, em graus de excitações variados, se expressam em freqüência e cores particulares dependendo da intensidade e qualidade do pensamento emitido, ou seja, da vibração mental emitida.

Considerando o terreno das manifestações da física dos átomos, sabemos que o calor, a luz e os raios gama, são expressões vibratórias de uma mesma energia.

A excitação, por exemplo, dos átomos de uma barra de ferro por uma fonte de energia permite produzirmos calor de uma extremidade à outra da barra de ferro. A excitação dos elétrons de um filamento metálico permitirá a transmissão da luz, e a agitação dos núcleos atômicos de determinados materiais produzirá emissão de raios gama.

Tanto quanto na matéria física, o pensamento, em graus variados de excitação, gera ondas de comprimento e freqüência correspondentes ao teor do impulso criador da vontade ou do objetivo desejado.

Como a matéria é expressão da energia em diferentes condições de vibração e velocidade, a energia mental também se manifesta conforme as variações da corrente ondulatória, em corpúsculos da matéria mental. Aqui também se identificam as mesmas leis que regulam a mecânica quântica na transmissão de energia entre as partículas sub-atômicas. Quando vibram os átomos da matéria mental, correspondendo à formação de calor na matéria física, geram-se ondas de comprimento longo que se estabelecem com o propósito de manutenção de nossa individualidade ou de simples noção do Eu. Essas ondas longas prestam-se, também, para sustentar a integração da nossa unidade corporal, mantendo interligado o universo de células que compõem o nosso corpo físico.

Quando ocorrem as vibrações dos elétrons da matéria mental, irradiam-se luzes de tonalidades diferentes conforme a energia atinja os elétrons da superfície ou das proximidades do núcleo do átomo mental. Esse tipo de agitação ondulatória corresponde à emissão de pensamentos de intensidades variadas que vão, desde uma atenção momentânea voltada rapidamente a um certo objetivo, até a uma reflexão ou uma concentração profunda tentando resolver questões complexas.

Por fim, já vimos que a excitação dos núcleos atômicos gera os raios gama e, no campo da mente, a correspondente vibração dos núcleos dos átomos mentais gera ondas ultra-curtas emitidas com imenso poder de penetração de suas energias. Essas vibrações resultam de expressões de sentimentos profundos, de cores cruciantes ou de atitudes de concentração muito intensas.

A Indução Mental

Indução, em termos eletrônicos, consiste na transmissão de uma energia eletromagnética entre dois corpos sem que haja contacto entre eles. Este fenômeno ocorre por conjugação de ondas através de um fluxo de energia que é transmitido de um corpo a outro. No campo mental o processo é idêntico.

Existe uma corrente de ondas suscetíveis de reproduzir suas próprias características sobre uma outra corrente mental que passa a sintonizar com ela.

Expressando qualquer pensamento em que acreditamos, estamos induzindo os outros a pensarem como nós. A aceitação que os outros fazem de nossas idéias passa a ser questão de sintonia.

Por outro lado, ao sentirmos uma idéia, absorvemos e passamos a refletir todas as correntes mentais que se assemelham a essa idéia, comungando os mesmos propósitos.

Portanto, nossas idéias e convicções nos ligam compulsóriamente a todas as mentes que pensam como nós e , quanto maior nossa insistência em sustentar uma idéia ou uma opinião, mais nos fixamos às correntes mentais das pessoas que se sentem como nós e que esposam as mesmas opiniões.

Imagens Mentais

O espírito é a fonte geradora de todas as expressões da vida, e toda espécie de vida se orienta ou se modifica pelo impulso mental.

Sempre que pensamos, estamos expressando uma vontade correspondente ao campo íntimo das idéias, e as idéias, representando a expressão de energia mental, se corporificam pelo pensamento em ondas e corpúsculos, que se organizam conforme o teor e a intensidade da vibração mental e o propósito do pensamento emitido.

Portanto, na expressão de qualquer pensamento, o comprimento da onda emitida varia com a intensidade da concentração nos objetivos desejados e a natureza das idéias emitidas. Com as idéias criamos em torno de nós um campo de vibrações mentais que identificam, pelo seu próprio conteúdo, as nossas mais íntimas condições psíquicas.

Nessa atmosfera ideatória que nos cerca, os corpúsculos da matéria mental que compõem nossos pensamentos modelam "imagens" correspondentes às idéias que mentalmente projetamos.

Psiquicamente, na medida em que expressamos mentalmente uma vontade, um desejo, uma idéia, uma opinião, um objetivo qualquer, passamos a ser carregadores ambulantes de vontades com formas, de desejos com moldes, de idéias vivas que as representam, de objetivos e opiniões que se exteriorizam com cenas que materializam em torno de nós os nossos pensamentos.

Nossa mente projeta fora de nós as formas, as figuras e os personagens de todos os nossos desejos, inclusive com todo o conteúdo dinâmico do cenário elaborado. Com essa constelação de adornos mentais atraímos ou repelimos as mentes que conosco assimilam ou desaprovam nosso modo de pensar.

Perturbações do Fluxo Mental

A criação da matéria mental se origina do estímulo ideatório do Espírito, que é a fonte da energia vital para o cérebro. O Fluido Cósmico fornece o elemento para essas construções. Os corpúsculos mentais, sob o impulso do Espírito são exteriorizados em movimentos de agitação constante, produzindo correntes de formas ideatórias que se expressam na aura da personalidade que os cria.

Nesses vórtices de energia em que cada individualidade se exprime em correntes de matéria mental, também se cria, pela corrente de átomos excitados, um fluxo energético com conseqüente resíduo eletromagnético, que se expressa na aura de cada um de nós. A capacidade criativa da mente alimenta de forma permanente essa corrente em constante agitação.

O fluxo resultante do processo ideatório pode apresentar perturbações semelhantes a defeitos da circulação da corrente elétrica comum a qualquer aparelho doméstico.

Assim, a ausência de uma corrente eletromagnética residual pode ser identificada no cérebro de pessoas profundamente ociosas. Os circuitos mentais podem permanecer bloqueados, impedindo a circulação do fluxo mental, em razão de idéias fixas ou obsessivas. As lesões orgânicas cerebrais perturbam, naturalmente, as expressões do pensamento, já que o cérebro é o veículo para a manifestação física da mente.

As Leis do Campo Mental

Nossa atividade mental através do discernimento e do raciocínio nos dá a prerrogativa de nós mesmos escolhermos nossos objetivos.

Projetando nossas idéias, produzimos os pensamentos, exteriorizando em torno de nós irradiações eletromagnéticas com poder mais ou menos intenso, conforme o comprimento das ondas mentalmente emitidas.

Essa corrente de partículas mentais nascidas de emoções, desejos, opiniões e vontades, constrói em torno de nós, cenas em forma de quadros vivos que são percebidos em flashes ou imagens seriadas, ou cenas contínuas que nos colocam em sintonia com todas as mentes que harmonizam com os pensamentos que exteriorizamos.

Já vimos, também, que somos suscetíveis de induzir pensamentos-imagens nos outros, assim como recebemos sugestões que se corporificam em formas vivificadas dentro de nossa psicosfera.

A simples leitura de uma página de jornal, uma conversação rotineira, a contemplação de um quadro, uma visita a familiares, o interesse por um espetáculo artístico ou programa de televisão, um simples conselho, são todos agentes de indução que nos compromete psiquicamente com as mentes sintonizadas nos mesmos assuntos.

Pensar ou conversar constantemente significa projetar nos outros e atrair para nós as mesmas imagens que criamos, suportando em nós mesmos as conseqüências dessa influência recíproca.

Persistir em idéias fixas, em comportamentos obsessivos ou tensões emocionais deliberadamente violentas, nos escraviza a um ambiente psiquicamente infeliz, com imagens que nós forjamos e que nos mantêm num circuito de reflexos condicionais viciosos.

Construindo com o conteúdo dos nossos pensamentos o campo mental que nos cerca, vivemos psiquicamente dentro dele, obedecendo a leis fundamentais relacionadas com a estruturação desse campo.

Por princípio, temos que entender que o campo mental é resultado de emissão de idéias que nós criamos, com nossa participação exclusiva e, portanto, com nossa total responsabilidade. Esta é a primeira lei do Campo Mental.

A segunda lei é a da assimilação, que estabelece que nós estamos ligados unicamente às mentes com quem nós nos afeiçoamos.

Portanto, além da sintonia, é necessário haver aceitação das idéias para que assimilemos as interferências boas ou más que recebemos.

A lei da assimilação significa também que uma idéia que nos incomoda, que nos martiriza ou nos revolta, só persiste em nós pela aceitação que fazemos de seu conteúdo e pelas ligações que mantemos com o seu emissor.

A terceira lei do campo mental está relacionada com o estudo e o aprendizado que desenvolve em nós o discernimento e o raciocínio. Ela estabelece que cada de um de nós só assimilará idéias, sugestões ou informações inéditas ou inovadoras, se já desenvolvemos a compreensão necessária ao avanço desses pontos de vista.


(Baseado na obra de André Luiz, "Mecanismos da Mediunidade", psicografada por F. C. Xavier e Valdo Vieira)

Nubor Orlando Facure


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sexta-feira, 23 de julho de 2010

O JULGAMENTO DE JESUS


Com a permissão do grande amigo Felipe do blog

Há tanto misticismo e confusão acerca da crucificação e ressurreição que acabamos perdendo de vista o fato de que Jesus de Nazaré foi julgado como homem diante de uma corte de homens sob as leis dos homens, condenado e executado como homem, e que como drama, o julgamento de Jesus supera quaisquer dos grandes julgamentos da história da justiça humana.
Abordarei esse assunto como advogado, não como teólogo. Recomendo a pesquisa dos aspectos teológicos dos eventos por conta de cada um. Creio que ter o ponto de vista de um advogado sobre os processos da lei que culminaram na morte de Jesus na cruz cruel do Calvário pode levar a uma melhor compreensão espiritual.
De início eu quero enfatizar que não considero que uma raça inteira de pessoas (os Judeus) tenha causado a morte de Jesus. E também não creio que nenhum Cristão inteligente pensaria isto.
Minha opinião é que apenas uns poucos homens poderosos em Israel - principalmente os sacerdotes superiores daquela nação - foram os responsáveis pela injustiça que ocorreu. Para entender quão grande foi essa injustiça, vamos examinar a lei Judaica como ela existia na época... Um verdadeiro e magnífico sistema de justiça criminal.
Sob as provisões da lei Judaica não poderia haver condenação por um crime capital baseado no testemunho de menos que duas pessoas. Uma testemunha era considerada a mesma coisa que nenhuma testemunha. Se houvessem apenas duas testemunhas, ambas teriam que concordar em todos os particulares até os mínimos detalhes. Sob a lei rabínica, o acusado tinha o direito de ter um defensor (o precursor da garantia de ter um advogado em processos criminais que é definido pela Sexta Emenda da Constituição dos Estados Unidos). Se o acusado não pudesse pagar pela defesa, um defensor seria escolhido para ele. Alguém poderia pensar no caso Gideon versus Wainwright, que deu origem ao sistema de defensores públicos como uma inovação. Mas na realidade essa era a prática das cortes desde há 2000 anos atrás!
Sob a lei Mosaica, um acusado não poderia ser obrigado a testemunhar contra si mesmo. Esse era o espírito da Quinta Emenda: "Ninguém deve ser obrigado a servir de testemunha contra si próprio em nenhum caso criminal." Eis o conceito de "apêlo a Quinta Emenda", que fez parte da justiça criminal desde os tempos de Moisés!
Uma confissão voluntária não era suficiente para a condenação sob a lei Judaica. O ônus da prova ainda era do Estado, que tinha que provar que a confissão, se houvesse sido feita, teria sido feita livremente, de forma voluntária e de plena consciência.
Hoje em dia, os policiais norte-americanos são obrigados a ler os "direitos Miranda" ("Você tem o direito de ficar calado. Tudo o que disser poderá ser usado contra você.", etc ...) para os acusados de forma que a Corte possa determinar que uma confissão seja feita livremente, voluntariamente e conscientemente.
Se uma confissão é feita depois que a lei Miranda foi ouvida e compreendida, a confissão pode ser admitida. Mas não era assim nos tempos de Jesus. A lei Judaica não admitia confissão, sob a crença de que o Estado jamais poderia se basear no que uma pessoa disse de sua própria boca para condená-la.
Uma evidência circunstancial é aquela que não está diretamente ligada ao crime, mas sim relacionada à outras evidências, que juntas, servem para que se deduza como um crime foi realizado. Em um julgamento, as impressões digitais da pessoa (evidência circunstancial) servem para deduzir que o acusado esteve em tal local e tocou em tal objeto, mesmo que ninguém tenha visto o acusado.
No caso em que uma testemunha diz "ouvi um tiro e quando cheguei à cena segundos depois, vi o acusado com uma arma na mão", essa evidência é circunstancial. O problema é que o acusado pode ter disparado um tiro contra o agressor que fugiu após o crime ou o acusado pode ter sido apenas alguém que pegou a arma depois que o agressor a jogou no chão.
Pois bem, as evidências circunstanciais também não eram admitidas. Hoje em dia, raramente se vê um caso nas cortes onde as evidências circunstanciais não sejam usadas. Atualmente, em muitos casos as únicas evidências existentes são totalmente circunstanciais.
Os depoimentos do tipo "ouvi fulano falar isso" (o "ouvir dizer") também não eram admitidos na época. Ainda temos essa regra contra admitir depoimentos de testemunhas que não estão no tribunal e que não podem ser examinadas pessoalmente, mas as exceções à essa regra têm demolido as proteções originais aos acusados.
A regra "inocente até prova em contrário" que nossas leis reconhecem hoje (isto é, um acusado é presumido inocente até que sua culpa tenha sido estabelecida por evidências e pela eliminação de qualquer dúvida razoável) também vem da lei Judaica e essa era a regra quando Jesus foi injustamente crucificado.
O acusado de um crime capital só podia ser julgado durante o dia e em público. Esse era o precursor da garantia constitucional de um julgamento em público.
Nenhuma evidência poderia ser apresentada se o acusado não estivesse presente. Isso deu origem ao atual direito que os acusados têm de estarem face a face com as testemunhas depondo contra eles. As testemunhas não tinham que jurar. O mandamento "Não dirás falso testemunho contra o teu próximo" era considerado suficiente para deter o perjúrio. Mentir na corte era perjúrio - sob juramento formal ou não.
E mais ainda, havia dois desestímulos adicionais ao perjúrio: (1) qualquer testemunha em um caso de crime capital que desse falso testemunho recebia a pena de morte, e (2) se o acusado de um crime capital fosse condenado, as testemunhas eram obrigadas a assistir à execução. Sob essa provisão da lei, as testemunhas geralmente escolhiam suas palavras cuidadosamente e só davam testemunho com grande cuidado!
O Grande Sinédrio, a Suprema Corte Judaica, era a única corte com jurisdição sobre crimes puníveis com a morte. A criação do Sinédrio é atribuída à Moisés. Foi uma corte de 70 membros composta de um Sumo Sacerdote como juiz principal, uma Câmara Religiosa de 23 sacerdotes, uma Câmara Legal de 23 escribas, e uma Câmara Popular de 23 anciãos. Era a essa corte que Jesus se referia quando ele disse que devia ir a Jerusalém e sofrer nas mãos dos anciãos, sacerdotes e escribas. Ele sabia que pela decisão deles ele seria morto.
Extremo cuidado era usado para selecionar os juízes dessa grande corte. Cada um devia ter pelo menos 40 anos de idade com experiência em pelo menos 3 cargos de dignidade gradativamente maior. Cada um tinha que ser uma pessoa de integridade incontestável e tido em alta estima por seus conterrâneos.
Membros do Sinédrio atuavam como juízes e jurados. Eles não tinham um júri separado. Qualquer membro com interesses ou conhecimento pessoal das partes era requerido que se retirasse do julgamento. A Corte tinha que decidir a questão da culpa ou inocência apenas com evidências apresentadas no tribunal.
O Sinédrio era encarregado sob a lei rabínica de proteger e defender o acusado. Nenhum membro da corte poderia atuar inteiramente como acusador ou promotor.
A lei requeria que a corte desse aos acusados o "benefício da dúvida" e para ajudar o acusado a estabelecer sua inocência.Os procedimentos de julgamento eram similares aos nossos. Seguindo-se à audiência preliminar, um sumário das evidências era dado por um dos juízes. Os espectadores eram então removidos do tribunal e os juízes votavam. Uma maioria era suficiente para condenar ou absolver. Se uma maioria votasse pela absolvição, o julgamento terminava e o condenado recebia a liberdade total. Se uma maioria votasse pela condenação, então um procedimento diferente era seguido.
Nenhum anúncio de veredito poderia ser feito nesse dia. A corte teria que adiar por um dia inteiro. Os juízes recebiam permissão para voltarem às suas casas mas não poderiam ocupar suas mentes em quaisquer atividades sociais ou de negócios. Eles tinham que devotar seu tempo inteiro para a consideração e reconsideração solene das evidências e retornar no dia seguinte para votar de novo.
Nesse segundo dia, qualquer juiz que houvesse votado pela absolvição não poderia mudar seu voto, mas qualquer juiz que, na primeira votação, houvesse julgado o acusado como "culpado" poderia mudar seu voto.
Durante esse tempo, o acusado ainda era presumido inocente.
Uma outra provisão peculiar da lei Judaica era de grande importância, porque um veredito unânime de culpa resultava na absolvição do acusado! Isso derivava do dever que a corte tinha de proteger e defender o acusado. A lei Mosaica estabelecia que desde que algum membro da corte tinha que fazer a defesa do acusado, um veredito unânime de culpa indicava que ninguém teria feito essa defesa, que poderia ter havido uma conspiração contra o acusado, e que ele não teria tido um amigo ou defensor. Tal veredito unânime era inválido e tinha o efeito de uma absolvição.
Israel não era uma democracia com Igreja e Estado separados, mas uma teocracia com Igreja e Estado entrelaçados como uma coisa só. Muitos acreditam que os altos sacerdotes ordenaram a prisão e julgamento ilegal de Jesus, que eles foram quem subornaram Judas, que eles sozinhos é que se sentiram ameaçados pelos ensinamentos de Jesus em público, e que eles sozinhos é que buscaram a morte de Jesus.
A prisão foi ilegal porque ela veio de noite, em violação à lei. Ela foi efetuada através das atividades do conspirador Judas Iscariotes em violação à lei rabínica. Ela não foi resultado de um mandado legal, novamente em violação ao código Mosaico. Os guardas romanos que prenderam Jesus no Jardim de Gethsemane e o trouxeram ao tribunal do Sumo Sacerdote não tinham uma ordem de prisão legal. O julgamento noturno é uma evidência adicional de conspiração contra Jesus por esses sacerdotes cuja hipocrisia o Carpinteiro denunciava publicamente. Sob a lei do Sinédrio, o primeiro passo deveria ter sido a audiência prévia com a leitura das acusações para o réu em uma corte aberta. O registro (incluindo os escritos de Mateus, Marcos, Lucas, João, Josephus, Philo e os Manuscritos do Mar Morto) não menciona nenhum audiência prévia. E eu assumo que Mateus, Marcos, Lucas e João são testemunhas com credibilidade. Nós podemos crer em seus testemunhos.
O registro diz que a corte procurou testemunhos falsos contra Jesus para justificar condená-lo à morte mas da primeira tentativa não conseguiram, apesar dos várias testemunhos falsos que surgiram. Houve perjúrios entre eles mas ninguém estava disposto a arriscar a terrível conseqüência de mentir contra um homem acusado de crime capital.
Mas finalmente surgiram duas falsas testemunhas, e nos disseram Mateus e
Marcos que ambos os testemunhos não concordam entre si. A primeira testemunhou para acusação de blasfêmia dizendo que Jesus havia dito "Eu sou capaz de destruir o Templo." A segunda testemunhou que Jesus havia dito "Eu vou destruir esse Templo."
Não houve outras testemunhas além dessas duas, e elas não concordavam entre si. Jesus deveria ser absolvido ainda antes de ser questionado em sua defesa... E certamente sem ser obrigado a testemunhar contra si próprio.
Porém, o sumo sacerdote Caifás invocou Jesus para que se defendesse (contrariando a lei). "E, levantando-se o sumo sacerdote no Sinédrio, perguntou a Jesus, dizendo: Nada respondes? Que testificam estes contra ti?" Jesus não respondeu.
Em vez de proteger e defender o acusado como requerido pela lei deles, o próprio sumo sacerdote se tornou o acusador, em franca violação das regras do julgamento. "Conjuro-te pelo Deus vivo", ele gritou, "que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus !"
Agora, coloquemo-nos na posição de um carpinteiro humilde diante dos homens mais poderosos do país, no maior tribunal da nação. É difícil imaginar quão grande foi a coerção e a pressão!
Embora Jesus pudesse continuar em silêncio, ele decidiu falar. "Se vo-lo disse, não o crereis, e também, se vos perguntar, não me respondereis." Os sacerdotes novamente perguntaram "És tu o Filho de Deus ?" A resposta de Jesus foi apenas "Vós dizeis que eu sou." Caifás então anunciou à Corte "De que mais testemunho necessitamos? Pois nós mesmos o ouvimos da sua boca." O resto dos homens daquela corte terrível, ouvindo essas palavras ditas pelo seu sumo sacerdote, ilegalmente confirmaram seu julgamento gritando "É réu de morte !"
A primeira audiência diante do Sinédrio foi concluída por volta das três da manhã. A Corte só adiou o julgamento até o nascer do sol, embora a lei exigisse que cada um deles deliberasse a sós por um dia inteiro antes da segunda audiência.
Eles retornaram apenas algumas horas depois, ao amanhecer. Lucas nos conta "E logo que foi dia, ajuntaram-se os anciãos do povo, e os principais dos sacerdotes e os escribas, e o conduziram ao seu concílio." Essa sessão foi superficial. Nenhuma testemunha foi invocada. Novamente a lei foi violada ao se exigir que Jesus respondesse à questão repetida "És tu o Filho de Deus?"
E novamente Jesus respondeu "Tu o disseste", e então acrescentou "digo-vos, porém, que vereis em breve o Filho do homem assentado à direita do Poder, e vindo sobre as nuvens do céu." Diante disso, a corte gritou "Para que precisamos ainda de testemunhas? Eis que bem ouvistes agora a sua blasfêmia."
A votação foi feita, os votos dos juízes foram contados, e Marcos nos conta "todos o consideraram culpado de morte." A importância disso reside naquela provisão peculiar da lei Judaica que requeria a absolvição se houvesse veredito unânime.
Sob a lei Judaica, a morte por apedrejamento era a sentença apropriada para uma ofensa capital. O povo Judeu não crucificava e esse método de executar a pena de morte era de origem Grega ou Romana. Os Judeus executavam os condenados por apedrejamento, decapitação ou estrangulamento de acordo com a natureza do crime. Para a blasfêmia era prescrita a morte por apedrejamento.
No entanto, o exército Romano que ocupava Jerusalém na época era o único com poder de anunciar e executar sentenças de morte. O Sinédrio tinha apenas autoridade para levantar a acusação perante um magistrado Romano ou governador militar, o qual tinha o dever de rever o processo inteiro em um julgamento separado tendo poder para decidir. Portanto, "logo ao amanhecer, os principais dos sacerdotes, com os anciãos, e os escribas, e todo o Sinédrio, tiveram conselho; e, ligando Jesus, o levaram e entregaram a Pilatos."
Normalmente se diz que o reino de Judah nos deu a religião e a Grécia nos deu as artes, mas Roma nos deu as leis. O sistema judicial Romano era incomparável em matéria de jurisprudência, mas Pilatos não seguiu o sistema Romano. Ele não exerceu julgamento independente de acordo com a lei mas cedeu às pressões políticas dos sacerdotes Judeus, violando assim a própria lei que ele estava encarregado de fazer cumprir.
Sua história é um exemplo de como os juízes devem ser sempre livres de pressões políticas, livres para decidir os casos baseando-se apenas na lei e nas evidências. Como Procurador Imperial na Jerusalém ocupada pelos Romanos da época, Pilatos tinha o dever legal de rever todas as evidências e procedimentos nos casos capitais trazidos até ele pelos líderes Judeus. Ele foi um bom juiz (até que a segurança de seu cargo foi ameaçada pela política).
Os sacerdotes levaram Jesus para a entrada do palácio de Pilatos. (Eles não poderiam entrar porque se tornariam impuros, sendo uma época de Páscoa.) Pilatos foi até eles dizendo "Que acusação trazeis contra este homem?".
Essa pergunta é importante porque demonstra a intenção de Pilatos em levar o caso como um julgamento à parte desde o início, começando a julgar a própria acusação. Ele não perguntou "Vocês condenaram esse homem de quê ?", mas em vez disso perguntou quais eram as acusações.
Os sacerdotes sabiam a importância da pergunta de Pilatos, então eles responderam indiretamente "Se este não fosse malfeitor, não te entregaríamos." Em outras palavras, Pilatos perguntou "qual a acusação contra este homem?" e os sacerdotes responderam "se ele não fosse culpado não estaria aqui!"
Pilatos percebeu essa tentativa de limitar sua jurisdição e induzi-lo a agir de acordo com a vontade deles. Isso o irritou e ele revidou: "Levai-o vós, e julgai-o segundo a vossa lei !" Os sacerdotes foram então forçados a admitir "A nós não nos é lícito matar pessoa alguma."
Tentemos entender o dilema desses sacerdotes em violação às leis. Se eles apresentassem Jesus como um homem condenado por blasfêmia com o depoimento de apenas duas testemunhas que não concordaram entre si, Pilatos reverteria o veredito. Se eles apresentassem Jesus como alguém condenado por sua própria confissão, Pilatos também dispensaria o veredito. E, é claro, se eles informassem que Jesus havia sido condenado por votação unânime, Pilatos entraria com um veredito de absolvição.
Então, os maliciosos sacerdotes apresentaram Jesus a Pilatos sob uma nova acusação que eles inventaram naquele momento: traição contra César. "Havemos achado este, pervertendo a nossa nação", disseram eles, "proibindo dar o tributo a César, e dizendo que ele mesmo é Cristo, o rei."
Pilatos chamou Jesus para dentro do palácio e o perguntou em privado "Tu és o rei dos Judeus?" E Jesus perguntou a Pilatos para saber a origem da nova acusação: "Tu dizes isso de ti mesmo, ou disseram-te outros de mim?" Pilatos replicou "a tua nação e os principais dos sacerdotes entregaram-te a mim", explicando com isso de onde havia sido originada aquela acusação de traição.
Era uma coisa plausível que um Judeu acusasse um Romano de traição ou que um Romano acusasse um Judeu, mas naquele momento eram os Judeus mais proeminentes da nação acusando um de seus conterrâneos de crime de traição contra Roma!
Jesus disse a Pilatos "O meu reino não é deste mundo." E Pilatos insistiu "Logo tu és rei? "Jesus respondeu "Tu dizes que eu sou rei. Eu para isso nasci, e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que é da verdade ouve a minha voz."
Pilatos então fez a famosa pergunta "Que é a verdade ?"
Jesus não deu resposta alguma senão a presença silenciosa de Si, o cordeiro levado ao sacrifício por mentirosos, de forma que Pilatos saiu para onde os sacerdotes estavam e, de acordo com João, pronunciou sua absolvição enfática do carpinteiro Nazareno. Ele disse a eles "Não acho nele crime algum!"
Até então, Pilatos havia seguido a lei à risca. A lei era boa. A lei teria libertado Jesus mas pela persistência desses maldosos sacerdotes que não se importavam em nada com as leis pelas quais eles mesmos governavam a terra e seus habitantes.
Era intolerável para esses inimigos da verdade que seu complô assassino fosse frustrado dessa maneira. Os sacerdotes soltaram rugidos de indignação "Alvoroça o povo ensinando por toda a Judéia, começando desde a Galiléia até aqui."
Essa acusação era a de sedição (revolta, motim, crime contra o Estado), que era menos odiosa que a traição. Ela exigia a prova de uma motivação corrupta para a condenação, mas ainda nenhum motivo maldoso se pode provar que existira em Jesus.
Pilatos ignorou essa acusação, mas com a referência à Galiléia, ele encontrou uma oportunidade de escapar do que o esperava. Herodes, o Tetrarca da Galiléia, estava em Jerusalém para a Páscoa. Pilatos viu nisso uma chance de transferir a responsabilidade para Herodes, que tinha jurisdição para julgar acusações de sedição. Jesus era Galileu. Os sacerdotes aprovaram essa ação porque eles pensavam que Herodes faria o que eles quisessem para ganhar seus favores.
Jesus foi arrastado até o palácio de Herodes, onde as acusações de traição e sedição foram reiteradas.
Herodes, contudo, não se impressionou. Ele havia ouvido a respeito dos ensinamentos de Jesus e o questionou, mas quando Jesus se recusou a responder (um direito de todo acusado), Herodes colocou nele uma túnica branca e o mandou de volta a Pilatos sem dar uma decisão. Se esse procedimento irregular tivesse qualquer status legal, ele levaria a uma nova absolvição. Pilatos concordou.
Lucas nos conta que quando os sacerdotes trouxeram Jesus de volta do palácio de Herodes, Pilatos saiu de encontro a eles e disse "Haveis-me apresentado este homem como pervertedor do povo; e eis que, examinando-o na vossa presença, nenhuma culpa, das de que o acusais, acho neste homem. Nem mesmo Herodes, porque a ele vos remeti, e eis que não tem feito coisa alguma digna de morte. Castigá-lo-ei pois, e soltá-lo-ei."
Notemos que Pilatos naquele momento cometeu um erro. Ele declarou "Esse homem é inocente. Herodes o julgou inocente e eu o julguei inocente. Eu vou, portanto, castigá-lo e soltá-lo !" Mas que autoridade legal tinha Pilatos para castigar um homem inocente? Porque ele fez isso?
Apesar de contrária à lei Romana, eu creio que Pilatos fez isso na esperança de que o castigo deixaria os sacerdotes satisfeitos de modo que eles cessariam suas exigências de morte. Assim, Pilatos ordenou o castigo de Jesus, não com uma punição branda, mas com o açoitamento até quase matar, com tiras de couro embutidas com pedaços de chumbo!
A imposição desse açoitamento ilegal foi, em si, um impedimento para punições ainda piores. Qualquer punição adicional violaria as leis tanto de Roma como de Israel, que estabeleciam que, já tendo o acusado sido condenado e punido, ele não poderia ser julgado novamente pelo mesmo crime.
João diz que "desde então Pilatos procurava soltá-lo", mas Jesus foi levado ao quartel dos soldados e despido de sua túnica branca que havia sido dada por Herodes, foi coberto com uma capa púrpura, coroado com uma guirlanda de espinhos, dado uma cana como cetro, e levado para ser confrontado pelos irados sacerdotes novamente.
Pilatos anunciou "Eis aqui o homem."Os sacerdotes responderam "Crucifica-o!" Tudo isso por ter Jesus desafia do a autoridade daqueles homens que estavam dispostos a violar as leis para causar sua morte, homens que por esta razão corromperam sua própria autoridade.
Pilatos então disse "Tomai-o vós, e crucificai-o; porque eu nenhum crime acho nele." Ali estava um juiz de leis dizendo "este homem é inocente, mas vocês podem matá-lo se o quiserem."
É claro que isso não satisfez os sacerdotes. Eles não ousariam crucificar Jesus sem uma aprovação inequívoca de uma autoridade Romana, porque fazer isso os sujeitaria a uma represália, possivelmente até a morte, nas mãos dos Romanos.
"Nós temos uma lei", eles insistiram, "e, segundo a nossa lei, ele deve morrer porque se fez Filho de Deus." E ao dizer isso, eles revelaram a Pilatos que sua verdadeira queixa contra Jesus era, na verdade, a acusação de blasfêmia.
Pilatos, que não havia ouvido ainda essa acusação, mais uma vez levou Jesus à parte e perguntou "Donde és tu ?" Essa era a equivalente à nossas modernas perguntas "De onde você vem ? Qual é a sua intenção?" Pilatos queria saber o que Jesus poderia ter feito para enraivecer tanto os sacerdotes ao ponto de violarem as leis sagradas de sua nação para condená-lo à morte ilegalmente.
Jesus não respondeu nada. Pilatos então vociferou "Não me falas a mim? não sabes tu que tenho poder para te crucificar e tenho poder para te soltar?"
Jesus apenas respondeu "Nenhum poder terias contra mim, se de cima te não fosse dado."
Pilatos novamente procurou soltar Jesus, mas os sacerdotes enraivecidos exclamaram "Se soltas este, não és amigo do César." Essa era uma ameaça à Pilatos. Poderia haver graves conseqüências se a mais alta corte de Israel denunciasse Pilatos à César. Pilatos sentiu que uma interpretação errada de seu julgamento poderia chegar aos ouvidos de César. Ele poderia ser visto como se estivesse protegendo alguém que era considerado pelos mais influentes de seus conterrâneos como culpado de traição. Pilatos não teve a coragem de lutar pela justiça contra esses sacerdotes coléricos.
Foi então que a esposa de Pilatos o enviou uma mensagem: "Não entres na questão desse justo."
Seu apelo levou Pilatos a tentar um último esforço para salvar Jesus sem arriscar seu cargo. Era costume durante a Páscoa de libertar um prisioneiro escolhido pelo povo. Pelo voto popular, as pessoas poderiam conceder anistia a qualquer um sentenciado à morte.
Eu vejo esse como um dos mais dramáticos momentos de toda a História, mas muito do drama passou despercebido pelos autores e dramaturgos, e uma lamentável confusão resultou em 2000 anos de animosidade desnecessária entre Cristãos e Judeus. Foram os sacerdotes Judeus que buscaram a morte de Jesus, não o povo.
O nome Barrabás em Hebraico significa filho de Abás. Pedro era referido por Mateus como "Pedro bar Jonas", isto é, Pedro filho de Jonas. Bar Mitzvah é traduzido literalmente como Filho da Lei. O nome de Barrabás também era Jesus: Jesus Barrabás.
A pergunta de Pilatos aos sacerdotes foi "Qual quereis que vos solte? [Jesus] Barrabás, ou Jesus chamado Cristo?" Eles clamaram, é claro, pela libertação de Barrabás, o notório ladrão e assassino. "Que farei então de Jesus, chamado Cristo?", perguntou Pilatos. Eles gritaram "Seja crucificado!" "Hei de crucificar o vosso rei?", perguntou Pilatos. E aqueles sacerdotes (que odiavam César como só os povos conquistados podiam odiar) disseram a Pilatos "Não temos rei senão o César!"
Pilatos enfraqueceu diante daquela ferocidade implacável e entregou Jesus para que o crucificassem. Ele tomou uma bacia de água diante dele, lavou suas mãos nela e anunciou "Estou inocente do sangue deste justo: considerai isso."
Pilatos mandou gravar na cruz "Jesus de Nazaré, o Rei dos Judeus". Caifás e os outros sacerdotes foram a Pilatos e pediram "Não escrevas 'Rei dos Judeus', mas que ele disse 'Sou Rei dos Judeus'." E Pilatos respondeu "O que escrevi, escrevi."
Jesus foi julgado desde antes de sua audiência. Ele foi acusado de três crimes separados. Os sacerdotes do Sinédrio o condenaram ilegalmente por blasfêmia. Pilatos se recusou a reconhecer esse procedimento inicial. Pilatos, por duas vezes, absolveu Jesus da acusação de traição. Ele foi acusado de sedição diante de Pilatos e Herodes, mas foi absolvido por ambos. E ainda assim, Jesus foi executado porque pretensamente se assumiu que ele havia sido considerado culpado de traição. Ameaçado com a possível perda de seu cargo, Pilatos escolheu crucificar Jesus como a maneira mais fácil de calar os coléricos sacerdotes.
Antes das doze horas daquele mesmo dia, Jesus foi crucificado em violação às leis de Israel e Roma, fechando o mais tenebroso capítulo da história da administração judicial e invocando o supremo chamado que o mundo jamais ouvira para que humanos obrassem pela justiça. Dois dos sistemas de leis mais esclarecidos que existiram foram prostituídos para destruir o homem mais inocente que já passou pela face da Terra.
Essa história nunca vai morrer, porque de sua verdade sempre nasce a esperança de toda a humanidade. Mais do que qualquer outro episódio na história do mundo, o julgamento de Jesus clama a todos os homens e mulheres de boa vontade para que trabalhem por um sistema de governo humano pelo qual possamos viver juntos em paz e segurança sob um Estado de Direito administrado com reverência pela Verdade e pelo Amor Caridoso.

ilustração: tela de Antonio Cesari
texto - http://cartasdepaulotarso.blogspot.com

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